Jornal Povo

A palavra de ordem é a união do povo de matriz africana!

Com visão geográfica e cercado pela natureza, o Babalorixá Lucas D’Oxaguian vai tocando o legado deixado por seu pai.

Foto: Bàbá Lucas D’Oxaguian

Como podemos perceber ultimamente, a nova geração não está nesse mundo à passeio e, com cada vez mais conhecimento, vão ocupando seu espaço no meio em que vivem.

Parece distante, mas é lá em Boca do Mato, no município de Cachoeira de Macacu/RJ, que o Babalorixá Lucas D’Oxaguian vai modificando a história de vida dos que procuram sua orientação espiritual.

Mesmo com o dia a dia atribulado por faculdade, trabalho e viagens, o rapaz vai mostrando porque enxergaram nele o potencial de tocar o legado deixado pelo Babalorixá José Flávio D’Oxaguian (em memória) e nós aproveitamos para contar um pouco desse percurso para vocês na entrevista abaixo.

Seu nome e sua origem?

– Sou Lucas Minervino e nasci no morro da Rocinha. Cresci e morei até minha adolescência, quando fui para Jacarepaguá, onde estou até hoje.

Como chegou até o Candomblé?

– Cheguei no Candomblé aos dois anos de idade, através da minha Mãe carnal, que levada pelo seu antigo chefe, foi realizar um jogo na casa e acabou sendo confirmada com a primeira Ekedji do Orixá de Papai Flávio. Ela se encontra no Ile até hoje ao meu lado. No início foi difícil, por conta de minha criação católica, mas minha identificação com o Candomblé e imensurável amor pelo meu Pai de Santo, me ajudaram nessa luta de resistência dentro da comunidade.

Qual a raiz de seu Ile Axé?

– O Ilê Axé Omin, casa fundada por José Flávio Pessoa de Barros ou Papai Flávio, como era chamado por seus filhos, descende do Ilê Axé Iya Nasso Oká, conhecida como Casa Branca do Engenho Velho e do Ilê Oxum, em Miguel Couto/RJ, casa da saudosa Iya Nitinha (em memória). Fui iniciado por meu Pai Flávio e sou o último Iyawo feito pelo mesmo. Hoje sigo dando continuidade ao Axé deixado pelo meu Pai.

De que maneira orienta seus filhos na manutenção da tradição do povo de matriz africana?

– A tradição dentro do Candomblé gera muitos debates e até mesmo conflitos, dentro das casas de axé. Seguir com os ensinamentos não é difícil quando queremos evitar tais confusões. Basta seguir a casa matriz, pois isso facilitará o entendimento de todos. Assim falaremos a mesma linguagem. A tradição vai muito além do saber. É respeitar, atender a hierarquia, ser humilde e entender que a sociedade se moderniza a cada dia. Entretanto, algumas essências não podem e não devem se perder. Temos que manter a base.

Cursando Geografia na faculdade e falando de Candomblé por localidade, você vê muita diferença entre as casas e seus estados?

– Papai Flávio quando criou o seu Axé foi muito sábio, pois o contato que a roça possui com a natureza é singular. Isso é fundamental para o Candomblé fluir e marca bastante as pessoas que conhecem nosso espaço. O Ilê fica longe do meio urbano, mas próximo das energias sagradas dos Orixás. As casas atuais não podem perder essa relação natureza/orixá mesmo que estejam situadas em área urbana e mais civilizada. Com plantações de árvores sagradas, ervas e conscientização dos membros da comunidade de um mundo mais ecológico, a essência do sagrado será mantida.

O que apontaria como diferencial no Candomblé do Rio de Janeiro, tendo em vista que a matriz é Salvador?

– Vejo um Candomblé entre Rio e Salvador bem símil. Cada território tem sua vantagem. Rio e São Paulo, por exemplo, possui uma variedade grande de tecidos e vestimentas, pois os preços são mais acessíveis. Já barro, esteiras e alguns outros elementos são mais fáceis de serem encontrados na Bahia e com preço mais em conta.

Como é dar continuidade no legado deixado por alguém da importância do Babalorixá José Flávio D’Oxaguian?

– Dar continuidade ao legado deixado pelo meu Pai, além de uma honra, é um fardo muito grande. Assumi muito novo, em meio a um momento confuso. Atribui a minha vida uma enorme responsabilidade. Estudar e ser Babalorixá é muito complicado, mas não impossível. Papai Flávio era acadêmico e é meu maior exemplo. Orixá nunca erra e é nisso que eu acredito. Não posso esquecer da esposa de meu Pai, a Ekedji Lucinha. Que sempre me apoiou, me apoia e é meu braço direito ali.

Você modernizou algo em relação ao que foi deixado?

– A modernização do Candomblé existe, pois nossas vidas ficam cada dia mais dinâmicas e transmuta devido ao sistema de governabilidade mundial e econômica. Isso vai existir em qualquer casa. Da mais nova até a matriz. Entretanto, o momento que eu vivi quando assumi o Ilê Axé Omin era de resgate a tradição. Uma vez que os galhos quebram e nos deixam, temos que nos agarrar ao tronco, na raiz.

Qual sua expectativa de candomblé para os próximos anos?

– Minha experiência no Candomblé é muito pouca. Tenho apenas 23 anos, curso duas faculdades, trabalho e sou Babalorixá. Acredito e desejo um Candomblé mais unido. Não podemos deixar que o sistema capitalista de competitividade e comércio entrem em nossas casas de Santo. Nosso terreiro é solo sagrado e precisa da união de todos.

Deixe um recado para o povo de matriz africana, por favor:

– União é a palavra de ordem para todo o povo de Candomblé de hoje. Não só em palavras, mas em atitudes. Como diz uma cantiga de Oxalá.

“É sìn ṣé ìpàdé siré”

Cultuamos para termos união e fazer xirê (Dançar, brincar para os Orixás)

Contato Bàbá Joaquim D’Ògún

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