Jornal Povo

‘Messias de arma na mão’ e ‘aldeia que não tem bispo’: sambas de 2020 não poupam críticas

Das 13 escolas do Grupo Especial, pelo menos dez inseriram críticas nas letras de seus sambas para 2020. “Messias de arma na mão”, “marajá em Bangu”, “respeita o meu axé” e “o Rio pede socorro” são alguns dos versos que miram em personagens ou questões da cidade e do Brasil.

Somente Beija-Flor de Nilópolis, Unidos de Vila Isabel e Unidos do Viradouro buscaram destacar personagens brasileiros, sem críticas diretas.

Horário dos desfiles do carnaval 2020 no Rio

HorárioDomingo (23 de fevereiro)Segunda (24 de fevereiro)Campeãs (29 de fevereiro)
21h30Estácio de SáSão Clemente6ª colocada
entre 22h30 e 22h40ViradouroVila Isabel5ª colocada
entre 23h30 e 23h50MangueiraSalgueiro4ª colocada
entre 0h30 e 1hParaíso do TuiutiUnidos da Tijuca3ª colocada
entre 1h30 e 2h10Grande RioMocidadeVice
entre 2h30 e 3h20União da IlhaBeija-Flor1° Colocada
entre 3h30 e 4h30Portela

Veja, a seguir, trechos dos sambas que querem dar um recado na Avenida.

Mangueira

A Estação Primeira de Mangueira vem aumentando gradativamente as críticas nos últimos carnavais. Em 2019, a escola conquistou o título com um samba que enaltecia os verdadeiros e esquecidos heróis nacionais.

Em 2020, a Verde e Rosa vai contar a história de Jesus Cristo. Mas de um Cristo negro e favelado, que sofre com preconceito e intolerância, em uma política belicista de segurança pública.

“Mas será que todo povo entendeu o meu recado?

Porque de novo cravejaram o meu corpo

Os profetas da intolerância”

“Favela, pega a visão

Não tem futuro sem partilha

Nem Messias de arma na mão”

Portela

Outra escola que vem com uma crítica bem direta, com endereço certo, é a Portela.

Em tempos de desmatamento, invasão e exploração de áreas indígenas, a escola vai falar dos índios que habitavam o Rio antes da chegada dos colonizadores portugueses e faz do samba a sua arma.

“Índio pede paz, mas é de guerra

Nossa aldeia é sem partido ou facção

Não tem bispo, nem se curva a capitão”

São Clemente

A São Clemente, com o enredo “O conto do vigário”, mantém sua característica mais irônica, irreverente e brincalhona. E não poderia ser diferente ao contar as vigarices que há séculos fazem parte da história do brasileiro.

Este ano ainda vem com um samba que tem como um de seus autores um humorista: Marcelo Adnet. Alguns versos são bem diretos.

“Tem laranja!

Na minha mão, uma é três e três é dez!”

“Tem marajá puxando férias em Bangu!”

“E o país inteiro assim sambou

Caiu na fake news!”

Paraíso do Tuiuti

Ao fazer um paralelo entre as histórias do rei de Portugal Dom Sebastião e o santo padroeiro do Rio de Janeiro, São Sebastião, a Paraíso do Tuiuti destaca em seu samba-enredo a luta diária da população humilde carioca.

“Orfeus tocam liras na favela

A cidade das mazelas

Pede ao santo proteção”

Estácio de Sá

Em tempos de consciência ambiental, a Estácio de Sá, com o enredo “Pedra”, da carnavalesca Rosa Magalhães, alerta para a cobiça desmedida dos homens que destroem a natureza, atrás de riqueza e poder.

“O garimpo traz o ouro a cobiça dos mortais

Peneirar, peneirar

Devastando a natureza no Pará dos Carajás”

Acadêmicos do Grande Rio

Com um enredo que conta a história do mais famoso, vaidoso e polêmico pai de santo da Baixada Fluminense – Joãozinho da Gomeia – a Acadêmicos do Grande Rio vem com um samba que também combate o preconceito e intolerância religiosa. E principalmente, pede respeito.

“Pelo amor de Deus, pelo amor que há na fé

Eu respeito seu amém

Você respeita meu axé”

União da Ilha do Governador

A União da Ilha vai falar da vida dos desvalidos moradores de comunidade no enredo “Nas encruzilhadas da vida; entre becos, ruas e vielas a sorte está lançada: salve-se quem puder”.

A letra destaca a violência vivida pelo povo e o descaso das autoridades.

“O chumbo trocado, o lenço na mão

Nessa terra de Deus-dará…

Eu sei o seu discurso oportunista

É a ganância, hipocrisia

O seu abraço é minha dor (seu doutor)

Eu sei que todo mal que vem do homem

Traz a miséria e causa fome

Será justiça de quem esperou”

Unidos da Tijuca

Com um enredo criado para destacar as belezas naturais e as construções feitas pelo homem e que fazem do Rio a Cidade Maravilhosa, a Unidos da Tijuca pede um pouco mais de atenção para o povo e o lugar.

“O Rio pede socorro

É terra que o homem maltrata

E meu clamor abraça o Redentor

A minha felicidade mora nesse lugar

Eu sou Favela!!!

O samba no compasso é mutirão de amor

Dignidade não é luxo, nem favor”

Mocidade Independente

Mesmo com um enredo para homenagear a cantora Elza Soares, a Mocidade Independente de Padre Miguel não perde a oportunidade de fazer uma crítica social em seu samba.

“Brasil, esquece o mal que te consome

Que os filhos do planeta fome

Não percam a esperança em seu cantar”

Acadêmicos do Salgueiro

Ao contar a história do primeiro palhaço negro brasileiro, o Salgueiro dá o seu recado contra o racismo.

“O rosto retinto exposto

Reflete no espelho

Na cara da gente um nariz vermelho

Num circo sem lona, sem rumo, sem par…”

“A luta me fez majestade

Na pele, o tom da coragem

Pro que está por vir…

Sorrir é resistir!”

Via: G1