Jornal Povo

Coronavírus: Mesmo durante isolamento social, bairros do Rio registram aumento na circulação de pessoas

RIO — A esteticista Walkíria Velasquez, de 43 anos, vestiu luvas e uma máscara cirúrgica para ir às compras nesta quinta-feira. Há cinco dias sem sair de casa, ela decidiu ir ao mercado, em Ipanema, porque não podia aguardar o prazo da entrega. Não foi a única. Entre as gôndolas do estabelecimento, os consumidores se esforçavam para manter distância entre si, e muitos cobriam os rostos com máscaras.

A adesão ao isolamento social fez a circulação de pessoas no Rio cair 85%, em média, segundo levantamento da empresa CyberLabs. Esse patamar se mantém desde a semana passada, mas o estudo mostra que em alguns bairros, como Ipanema e Leblon, houve um aumento de 10% na circulação de pessoas desde o início da semana.

Grande quantidade de gente se exercitando no entorno da Lagoa Rodrigo de Freitas chamou a atenção Foto: Guito Moreto / Agência O Globo
Grande quantidade de gente se exercitando no entorno da Lagoa Rodrigo de Freitas chamou a atenção Foto: Guito Moreto / Agência O Globo

A comparação é feita com números anteriores à pandemia da Covid-19, por meio da contagem automática do número de pessoas presentes em cerca de 800 câmeras externas de videomonitoramento. A CyberLabs identifica aglomeração de pessoas em tempo real e obtém um histórico de presença de pessoas em diferentes locais.

De acordo com os dados, os bairros de Ipanema e Leblon atingiram o patamar de 85% de redução na circulação de pessoas na segunda-feira. Ontem, o número caiu para 75%, indicando que a quantidade de pessoas que estava permanecendo em casa retraiu. O levantamento analisa sete bairros: Centro, Copacabana, Ipanema,Leblon, Botafogo, Tijuca e Barra da Tijuca – os dois últimos com menor concentração nas ruas, ambos com 90% nos quatro últimos levantamentos.

— Observamos que a circulação de pessoas no Rio voltou a aumentar nos últimos dias, sobretudo nos bairros de Ipanema e Leblon. O Centro também teve uma piora nesse sentido, mas voltou para a normalidade. Outro bairro que tem dificuldade para respeitar a quarentena é Botafogo — afirma o engenheiro mecatrônico Felipe Vignoli, sócio-fundador da Cyberlabs.

Com o comércio fechado, a maior parte das pessoas que estava nas ruas de Ipanema e Leblon, ontem, se dirigiam a bancos, farmácias ou mercados. A técnica de enfermagem Maria Alice Barbosa, de 54 anos, viu três idosos entrarem no banco onde ela estava, na Visconde de Pirajá, num intervalo de menos de dez minutos.

— Acho que muitas pessoas ainda não entenderam a gravidade do risco de ser contaminado com o coronavírus e por isso continuam saindo de casa normalmente. Os idoso, principalmente, precisam se resguardar — disse.

Moradora da Cruzada de São Sebastião, a profissional da área de saúde afirma que já há casos suspeitos na comunidade, o que preocupa a vizinhança.

— Os moradores de comunidade têm menos acesso a produtos de higiene e ao sistema de saúde. Temos nos esforçado em ações para ajudar os que devem permanecer em casa, mas não tem sido o suficiente — diz ela.

Em Copacabana, a presença de agentes da Guarda Municipal não parecia intimidar o vai e vem de pessoas em frente a um supermercado. A movimentação chamou a atenção de moradores de rua, que abordavam os clientes na saída pedindo esmolas. A estudante Erika Lanos Silva, de 18 anos, moradora da Ladeira dos Tabajaras, diz que vai quase todos os dias ao estabelecimento.

— Cuido de um bar e não posso deixar o lugar desabastecido — explica ela, acrescentando que na favela a maioria dos estabelecimentos comerciais segue em pleno funcionamento.

Embora a prefeitura tenha fechado parques e praças, como a Praça Serzedelo Corrêa, ainda era possível ver pessoas caminhando tranquilamente no calçadão de Copacabana e na orla da Lagoa, na quinta-feira.

Nos transportes públicos, as concessionárias afirmam que a queda na circulação de passageiros se estabilizou desde a semana passada. Nos trens da Supervia, a redução média foi de 70%. Nas barcas, de 75%, mesmo percentual de queda registrado no BRT em relação ao período anterior à pandemia.

O metrô informou que a média se mantém e enviou uma lista com a queda percentual de passageiros dia a dia. Na quarta-feira, a queda foi de 84%, três pontos percentuais a mais do que na quarta-feira da semana anterior, quando a queda foi de 87%. Questionada sobre quanto representam os três pontos percentuais em números absolutos de passageiros, a concessionária afirmou que a comparação não pode ser feita entre as duas últimas quartas-feiras, pois “a comparação é sempre com um dia de operação regular”.

Ruas cheias na Baixada

Com 19 casos confirmados pela Secretaria estadual de Saúde e pelo menos duas mortes sob investigação, a Baixada Fluminense teve um bom número de pessoas circulando em suas principais ruas, nesta quinta-feira, por conta do pagamento de aposentados e pensionistas, que ocorre sempre no início do mês. Foi o que aconteceu, por exemplo, em Belford Roxo, onde muita gente se aglomerou em filas na porta de agências bancárias.

De acordo com o município, um aposentado, de 72 anos, foi a primeira morte registrada com Covid-19 na cidade. A SES ainda aguarda o resultado de exames para incluir o idoso na estatística, que até a última quinta-feira, tinha um total de 28 mortes no estado.

Enquanto alguns dos maiores municípios da Baixada (Nova Iguaçu, São João de Meriti e Belford Roxo) já tinham fechado a maior parte comércio para dificultar a disseminação da doença, só agora Duque de Caxias, onde há seis casos de Covid-19, tomou a mesma providência. A medida foi publicada em um decreto assinado no último dia 31 pelo prefeito Washington Reis, que prorroga por tempo indeterminado a situação de emergência na cidade. Além dos serviços essenciais, como postos de combustíveis, farmácias e mercados, a medida deixa de fora bares e lanchonetes. Estes estabelecimentos poderão abrir suas portas, desde que permaneçam trabalhando apenas com 30% de sua capacidade de lotação.

Já em Nova Iguaçu, onde há sete casos confirmados de coronavírus, o prefeito Rogério Lisboa decretou estado de calamidade pública. A medida ratifica dispensa de licitação para compra de materiais e serviços que serão utilizados no combate ao coronavírus.

São João de Meriti, Belford Roxo e Mesquita também contam com restrições que impedem o funcionamento da maior parte do comércio. Em Mesquita, a morte de um morador, ocorrida na quarta-feira, no Hospital Ronaldo Gazolla, em Acari, na Zona Norte do Rio, também é investigada pela SES. Ele fez exames, antes de morrer para confirmar ou não se estava com a Covid-19. Os resultados deverão ficar prontos nos próximos dias.

Fonte: O Globo