RIO – Cientistas brasileiros testaram com sucesso contra o coronavírus uma droga que tem sido usada há quase duas décadas contra o HIV. O remédio é o atazanavir, que desde 2003 trata pacientes com Aids. Um grupo de pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) mostrou que em testes com culturas de células ela reduz em até 100 vezes a velocidade de replicação do vírus Sars-CoV-2. Porém, devido ao histórico com a Aids, é potencialmente menos tóxica do que, por exemplo, a cloroquina, que também atua sobre a multiplicação do vírus nas células.
A descoberta não significa que a atazanavir poderá ser empregado imediatamente no tratamento de vítimas da Covid 19. Indica, porém, que tem resultados bons o suficiente para que mereça ser testada em estudos maiores. Em tese, ela também pode reduzir a inflamação generalizada associada aos casos mais graves de Covid.
Mas os pesquisadores ainda não sabem se o efeito contra a inflamação se deve à redução da quantidade de vírus ou se o medicamento é mesmo anti-inflamatório. A primeira opção é considerada a mais provável, isto é, que a produção de substâncias inflamatórias pelas células humanas tratadas seja menor porque a carga de vírus foi reduzida.
A própria equipe da Fiocruz já iniciou testes com camundongos, explica o líder do estudo, Thiago Moreno Souza, do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS), do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz). A droga é da classe dos inibidores de protease. Ela atua bloqueando a ação de uma enzima, a protease, essencial para que o vírus possa se multiplicar dentro das células humanas invadidas.
O resultado dos testes foi publicado num estudo na revista bioRxiv, mas ainda não passou por revisão por pares, como tem acontecido com a maioria dos estudos sobre a Covid 19, dada a urgência da pandemia. Nos testes, ela se saiu melhor ou igual à cloroquina, com a vantagem de ser considerada bem menos tóxica para o organismo.
Enquanto a cloroquina pode afetar coração, olhos e neurônios, o atazanavir é empregado para pacientes com HIV sem efeitos da mesma toxicidade conhecidos. Segundo Souza, a dose equivalente em humanos à testada com células seria compatível com a considerada segura.
– Com nosso estudo queremos chamar a atenção da comunidade científica de que há uma droga interessante para ser testada – diz Souza.
Se comprovado por mais estudos, o tratamento com o atazanovir seria para pacientes que desenvolveram pneumonia, mas não estão na fase mais grave da doença, quando há uma reação inflamatória generalizada. Ela impediria justamente que esse processo fosse iniciado.
– Não se trata de uma opção de profilaxia, mas de uma potencial possibilidade de tratamento – explica ele.
Fonte: O Globo