Jornal Povo

A vida depois da cura: o que fazer após ter alta da Covid-19

Com a expansão no número de casos confirmados de Covid-19, outra realidade ganha espaço: a das pessoas que se recuperaram da doença. Em meio a orientações sobre como se prevenir contra o novo coronavírus e o que fazer em caso de sintomas, surge uma dúvida dos que já passaram pelas duas etapas. Depois da alta, seja laboratorial (quando o exame detecta a presença de anticorpos, mas a ausência do vírus) ou clínica (os sintomas já estão ausentes há algum tempo), a pessoa pode romper o isolamento e voltar às sua rotina “normal” de atividades?

— Obviamente, o nível de severidade da doença em cada indivíduo tem a ver com sua alta clínica. Há pessoas que se internarão por causa da Covid-19, ficarão dias em UTI e vão precisar, depois, de tratamentos de recuperação, como fisioterapia respiratória e muscular, entre outros. Mas se a pessoa ficou em casa, apresentou sintomas leves da doença e se recuperou bem, ela pode voltar às suas atividades regulares, sem cuidado adicional de saúde durante a convalescença — diz o médico infectologista Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).

O médico acrescenta que, diante das “não evidências robustas” de reinfecção a curto prazo de uma pessoa pelo vírus, pessoas recuperadas podem ser muito úteis à sociedade durante a pandemia.

— Uma pessoa imunizada é desejada neste momento, pois pode ajudar outras pessoas que não se infectaram. O recuperado pode se oferecer para fazer as compras da família e dos vizinhos, cuidar dos idosos, tão solitários atualmente, e ser o que vai levar um doente para o hospital. Ele é “o motorista da vez” — afirma Kfouri.

Outra possibilidade é a de oferecer ajuda no combate à pandemia, doando o plasma de seu sangue a centros de pesquisa que estão fazendo estudos sobre a possibilidade de transmissão passiva de anticorpos a pacientes com a doença ativa. No Rio, o Hemorio está fazendo a coleta de plasma para estudos. Em São Paulo, um consórcio entre a Universidade de São Paulo e os hospitais Albert Einstein e Sírio-Libanês também investe na pesquisa, selecionando candidatos para a doação.

Uma nova rotina

Depois da cura Foto: Arte O Globo

– A pessoa deve se certificar de que está realmente recuperada: na falta de testes para um diagnóstico laboratorial de cura, quando se verifica que não há mais o vírus no organismo, deve-se considerar a “cura clínica” indicada pelo médico que o acompanha. Pacientes que não foram hospitalizados e não tiveram complicações da Covid-19, apresentando sintomas leves da doença, devem aguardar pelo menos 14 dias a partir do início dos sintomas, para só então serem declarados “curados” e sem riscos de transmitir a doença para outras pessoas.

Depois da cura Foto: Arte O Globo

– Ir ou não para a rua: não há evidências, pelo mundo, de reinfecção de pacientes pelo coronavírus após sua alta. E, ainda que a doença reincida a longo prazo (o que ainda não pode ser indicado por se tratar de uma doença recentemente conhecida), a experiência com esta e outras doenças infecciosas mostra que o número de anticorpos no sangue pós-infecção é tão grande que o corpo ganha uma “imunidade temporária” em relação à doença, o que permitiria a livre circulação de pessoas recuperadas.

Depois da cura Foto: Arte O Globo

– Não é para relaxar com a higienização das mãos e deve-se evitar o contato com superfícies públicas muito tocadas: só porque a pessoa não é capaz de transmitir a Covid-19 pelas vias aéreas, isso não quer dizer que ela não possa carregar o vírus que se encontra em superfícies contaminadas. Chegou da rua? É para tomar banho e trocar as roupas.

Depois da cura Foto: Arte O Globo

– Após a alta, a pessoa não mais transmitirá a doença falando, espirrando ou tossindo. Mas, antes de parar de usar máscaras, é importante certificar-se das recomendações de cada município sobre o seu uso em lugares públicos.

Depois da cura Foto: Arte O Globo

– É uma vida “quase” normal: ao não apresentar mais o vírus no sangue, o recuperado pode trabalhar, fazer exercícios e se relacionar com outras pessoas. Diferentemente de doenças como o sarampo e a catapora, que podem ser imunossupressoras no período de convalescença, tornando o corpo mais suscetível a outras enfermidades, não há evidências de que a Covid-19 gere a necessidade de um cuidado especial com a saúde além do já praticado. Isto não se relaciona com a necessidade de tratamentos complementares (como fisioterapia respiratória ou muscular) para pacientes que tiveram complicações e quadros mais graves da doença.

Depois da cura Foto: Arte O Globo

– A recuperação pode ser aproveitada na oferta de ajuda a outras pessoas, como vizinhos, amigos ou familiares, sobretudo os que estão em grupo de risco: que tal o recuperado fazer as compras da família? Ou levar algum enfermo próximo ao hospital? É ele quem pode ir à rua resolver os problemas que não podem ser solucionados de casa.

Depois da cura Foto: Arte O Globo

-O paciente recuperado pode visitar e oferecer sua companhia a idosos próximos, que podem estar sofrendo com a solidão e sentimentos de depressão neste momento.

Depois da cura Foto: Arte O Globo

– Quem tem alta também pode cuidar de outros enfermos: se alguém em sua casa ou família pegar a doença, ele pode ser a pessoa em contato direto com o doente, ajudando-o a superar o momento.

Depois da cura Foto: Arte O Globo

– Doação de sangue: por conta da recomendação de isolamento em casa quando possível, bancos de sangue de todo o país estão sofrendo com a diminuição das doações recebidas. Doenças respiratórias não são transmitidas por transfusões sanguíneas, então o paciente recuperado pode ser um doador.

Depois da cura Foto: Arte O Globo

– Doação do plasma para estudos: uma vez imunizada, a pessoa pode fazer contato com hemocentros e centros de pesquisa que vêm realizando estudos sobre o uso dos anticorpos presentes no plasma do sangue de pessoas que já tiveram a Covid-19 para o tratamento de pacientes com doença ativa. O paciente recuperado pode ser um doador.

Fontes: Renato Kfouri, médico infectologista pediátrico e diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm); Vanderson Rocha, Chefe da Divisão de Hematologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP); e Hemorio.

Fonte: O Globo