Jornal Povo

Crivella não executa emendas que não sejam de seus aliados, afirma Marcelo Calero, pré-candidato a prefeito do Rio

Deputado Federal está na disputa pela cadeira na prefeitura.

O Jornal Povo publicará matérias exclusivas das entrevistas feitas pelo empresário Tadeu Vieira com os pré-candidatos à prefeitura do Rio. O espaço é para que eles exponham suas ideias, falem sobre seus planos de governo e debatam os assuntos de interesse público.

Dessa vez o entrevistado é o deputado federal Marcelo Calero, que disputa a vaga de prefeito pelo Cidadania, partido que é filiado desde 2018. Em 2016 ele foi Ministro da Cultura do governo de Michel Temer. O pré-candidato também é advogado e diplomata.

Marcelo começou a entrevista falando sobre como a cultura, área em que ele mais atuou na sua vida pública, tem sido conduzida pelo presidente Jair Bolsonaro.  O presidente extinguiu com o Ministério da Cultura e o transformou em secretaria subordinada a outros ministérios.

“Primeiro a gente tem que lamentar o fato da cultura ser gerida por um ministério.  O que é pior do que isso é essa crise institucional que se abateu na cultura depois da criação dessa secretaria. Essa secretaria já passou pelo Ministério da Cidadania e agora é do Ministério do Turismo.  Metade da estrutura está no Ministério da Cidadania e a outra metade está no Ministério do Turismo. É uma desorganização institucional que revela um desapreço, uma desimportância para a área da cultura”, disse ele.

Ele também criticou como o setor cultural vem sendo tratado pela prefeitura do Rio, com falta de investimentos e incentivo a realização de eventos na cidade.

“Hoje o que a prefeitura do Rio mais faz é atrapalhar os eventos. É claro que os eventos têm que respeitar e obedecer uma série de normas que tem que rigorosas, porque estamos falando de um contingente de pessoas grande de audiência nesses eventos. Agora, você não pode com essas exigências inviabilizar a realização deles, que também é uma vocação natural do Rio. Nós temos espaço para isso. De outra forma também, nós precisamos organizar calendários. Eu acho que isso a prefeitura pode fazer, se dedicar. No início do governo Crivella houve uma tentativa disso, mas que acabou se esvaindo, que foi aquele calendário ‘de Janeiro a Janeiro’. Bateram bumbo, foi feita muita propaganda, mas aquilo não aconteceu. Organizar esses diversos atores, entender quais são os gargalos e a prefeitura pode contribuir com isso oferecendo sua força de trabalho, sua força logística, oferecendo ordem pública”, disse ele. 

“ A gente tem que lembrar que a cultura, especialmente na cidade do Rio de Janeiro, que aos trancos e barrancos ainda é a capital cultural do país.  A cultura gera muito emprego e gera muita renda. A cultura precisa debatida com o espírito desarmado. Não adianta vir com aquele discurso de que os artistas mamam nas tetas da Lei Rouanet. Vamos parar de repetir historinhas que a gente recebe no WhatsApp que tem pouco ou nenhum fundamento”, completou.

Turismo e eventos colaborativos

Outros dois setores falados por Calero que precisam de mais atenção por parte da prefeitura do Rio são os de turismo e de eventos colaborativos. A baixa nesses dois setores, de acordo com o pré-candidato, é algo que atrapalha até mesmo na economia carioca.

“Estamos perdendo para São Paulo nos eventos colaborativos. Os grandes eventos trazem recursos importantes para as empresas dos produtores e empregam muita gente, mas o dia-a-dia a ali, o que faz com que a empresa se mantenha viva, são os eventos corporativos. É o Simpósio de médicos, encontro dos empresários, seminário dos enfermeiros. E até para isso temos perdido. Essa perda do Rio como referência nacional traz prejuízo ao nosso cotidiano […] o cotidiano é modificado por essa progressiva perda da condição de capitalidade do Rio. E ter capitalidade é: Ter o Rio como referência”, disse.

“Eu morei três anos no México, porque sou diplomata. No México as pessoas levam o turismo muito a sério […] No Brasil é tratado como oba oba. As pessoas acham que cultura e entretenimento aqui é bagunça. E aí nós vemos o quanto somos despreparados para essa nova economia. Os países ganham rios de dinheiro, estou falando aqui da Espanha, França, Portugal. Os grandes museus que as pessoas vão aos países só para visitar esses museus. E aqui a gente diz que é desperdício de dinheiro, pessoal que mama nas tetas. Pelo amor de Deus, uma falta de visão”, diz ele sobre a desvalorização do turismo. 

“Nós vivemos a maior crise da história do Rio de Janeiro, de uma desprefeitura, de um desprefeito que não faz entregas e que não gosta da cidade. Hoje nós temos um prefeito que não gosta do Rio de Janeiro, da sua identidade e da sua cultura. Ele lá atrás, na sua eleição, ele veio com uma história de que iria cuidar das pessoas. Não sei que pessoas, talvez as mais próximas a ele”, disse o pré-candidato.

Saúde

Calero também falou a respeito da saúde. O pré-candidato enfatizou a importância dos hospitais federais do Rio de Janeiro no combate a pandemia do coronavírus. Mas, além disso, destacou a importância do fortalecimento dos recursos e serviços desses hospitais.

 “O Rio de Janeiro tem o privilégio de ter vários Hospitais Federais espalhados pela cidade. Isso é um privilégio e ao mesmo tempo uma responsabilidade.  Privilégio no sentido de que a gente a rigor, teria essas unidades a disposição da população. Agora, é uma responsabilidade porque ao mesmo tempo o Rio de Janeiro é referência nacional no SUS. O meu temor é o seguinte: Nós temos sucateamento dos Hospitais Federais. Isso é ruim sob esses dois aspectos que eu relatei. Primeiro porque a população do Rio de Janeiro deixa de ter acesso a essas unidades de saúde […] Fui fazer inspeção no INTO recentemente e ouvi quase que um apelo dos gestores. Eles diziam que precisam de alguém para os ajudar. Você olhar o Into, aquele hospital de ponta que foi inaugurado em 2011 com 330 leitos e metade não utilizados, é uma catástrofe, uma vergonha”, disse.

E como se já não bastasse o não uso dos hospitais federais no Rio para ajudar a suprir os impactos da pandemia, ainda há um outro dilema: A demora da entrega dos Hospitais de Campanha. No Rio de Janeiro, apenas três dos nove hospitais prometidos foram entregues à população, sendo que 1 é da prefeitura e outro praticamente privado, no Leblon.

“ Eu questiono muito esses Hospitais de Campanha públicos. Nós temos uma rede hospitalar instalada no Rio de Janeiro enorme e eu pude constatar isso ao vivo. Precisamos utilizar essa rede em sua plenitude. Não adianta nada construir hospital de campanha como peça fundamental de Marketing enquanto a gente tem leito vazio no Miguel Couto, quando se tem um tomógrafo que o Crivella inaugurou e não pode ser utilizado por problemas técnicos. Vamos tratar as coisas com seriedade”, disse o pré-candidato.

Sobre o episódio dos tomógrafos na Igreja Universal na Zona Sul, ele diz:

“É muita cara de pau.  Desde aquele episódio da Marcia, que todo mundo lembra, daquela reunião no Palácio da Cidade, houve uma ação do Ministério Público, que nesse momento está no STF porque foi determinado ao prefeito uma série de regras pelo seu comportamento tendo em vista aquele episódio. E a gente deve lembrar que naquela ocasião o Ministério Público pediu o afastamento do prefeito por suspeita de utilização da máquina da prefeitura em favor da sua organização religiosa. Já é um contexto que esse tipo de prática está muito em alerta. E aí você coloca um tomógrafo no estacionamento de uma igreja, sem qualquer tipo de instrumento jurídico que pudesse basear aquilo, feito às escuras. É um comportamento que a gente não pode aceitar”.

O pré-candidato Marcelo Calero (em baixo) e o empresário Tadeu Vieira durante a entrevista-foto reprodução do Instagram

Eduardo Paes

Marcelo Calero fez parte da gestão Eduardo Paes. Ele inclusive diz que é cria da política do ex-prefeito do Rio, além de ter amizade pessoal com ele. Questionado se sua candidatura seguisse se Paes entrasse na disputa, ele respondeu:

“O Eduardo Paes. Todos sabem da minha relação de proximidade com ele. Fui secretário de cultura dele e me orgulho dessa secretaria, tenho conversado muito com ele sobre o cenário atual e eu não problema nenhum. Eu acho que, o mais transparente que nós formos a respeito disso é o que a população espera. É natural da política termos debates, discussões, negociações, articulações. Não podemos criminalizar isso […] É claro que eu e Eduardo temos muitas convergências, temos algumas divergências e temos a responsabilidade, como líderes políticos que somos, de termos conversos políticas maduras, transparentes e honestas a respeito da nossa cidade. Do futuro político da nossa cidade e do que desejamos construir em termos de projetos para o Rio de Janeiro, em especial nesse momento que nossa cidade está tão para baixo. Seria uma irresponsabilidade, tanto minha, quanto dele, se não sentássemos para conversar […] é um momento único e nós precisamos ter a reponsabilidade de encarar esse momento único de uma maneira única, sem vaidades pessoais”.      

Dificuldade de se enviar emendas à prefeitura do Rio

O pré-candidato falou sobre a dificuldade de se enviar emendas a prefeitura do Rio vindas dos deputados federais. Segundo ele, Crivella não aprova emendas que venham da oposição. Ele não é o único a fazer essa reclamação. Em entrevista também a Tadeu Vieira, a pré-candidata Clarissa Garotinho, também falou da dificuldade que se tem de entregar emendas a prefeitura. Ela, que foi secretaria do governo Crivella, disse que só nas emendas que enviou seriam na ordem dos R$ 6 milhões de reais e que não foram executadas, ou seja, perdidas pela administração.

“Tínhamos muita resistência em mandar emendar para o Rio de Janeiro. Você coloca emenda e ela muitas vezes não é executada por questões políticas, o prefeito as vezes não executar porque veio de um adversário e simplesmente o dinheiro se perde. É inadmissível”, disse.

Eleições na pandemia

O pré-candidato também falou sobre o cenário que está sendo desenhado para às eleições desse ano em meio a pandemia do coronavírus.

“Acho que no final das contas vamos ter que pensar um pouco nessas eleições. O TSE já está fazendo estudos para postergar a data das eleições. Acho que não seria o caso de postergar mandato, a não ser que haja realmente uma catástrofe de grandes proporções, porque isso seria antidemocrático”.  

Renovação de lideranças

O pré-candidato acredita que, apesar de haver uma grande resistência de se passar emendas, projetos e dificuldade de diálogo entre os poderes, a política precisa passar por um momento de renovação de lideranças para que tudo comece a melhorar.

“Eu acho que no Brasil estamos passando por um momento importante de renovação das lideranças. É claro que existe a burocracia e velhas práticas dentro da própria administração e isso acaba dificultando as vezes o trabalho, mas o fato é que, nesse aspecto em particular eu sou otimista. Essa renovação de lideranças vai trazer para o Brasil um momento muito virtuoso, que não está muito distante”, disse.      

Reconstrução do Rio de Janeiro

O deputado diz que o momento agora é de reconstrução da cidade do Rio, e que o prefeito eleito ano que vem precisa estar focado nesse objetivo.

“Nós temos uma responsabilidade enorme, que é de reconstrução do Rio de Janeiro. É um desafio que eu comparo muito com a que o Rio viveu em 1960, quando a capital foi para Brasília […] Mais uma vez nós teremos que nos reinventar. E para isso a união de todos os cariocas, independente da sua posição política, seu credo. É imprescindível. Nós vamos ter que salvar a cidade. Precisamos regatar a cidade. Resgatar a suas vocações e sobretudo o amor pelo Rio de Janeiro”, finalizou.

A entrevista foi relizada e está disponível no Instagram do Tadeu Vieira: https://www.instagram.com/tadeuvieira.rio/