Jornal Povo

Médica diz ter sido agredida por cinco homens ao reclamar de barulho de festa no Grajaú

Rio – Atuando na linha de frente do combate ao novo coronavírus (covid-19) no hospital de campanha da Lagoa, a médica anestesista Ticyana Azambuja, de 35 anos, não imaginava que em plena pandemia iria ser obrigada a parar de trabalhar. Com a mão e perna direitas enfaixadas há dois dias, a profissional diz que foi agredida violentamente por cinco homens, quando foi reclamar do barulho de uma festa próximo de sua casa, na Rua Marechal Jofre, no Grajaú, na Zona Norte do Rio.

“Eles me enforcaram a ponto de eu desmaiar, me chutaram, deram vários tapas na minha cara, pisotearam minhas duas mãos e quebraram meu joelho”, a médica relembra os momentos de horror vividos na tarde de sábado, que contou com a participação de um homem que se apresentou como policial.

Ticyana, que também trabalha no Hospital Universitário Pedro Ernesto (Hupe), disse que as agressões começaram porque ela foi reclamar do som alto da festa, que acontece livremente em plena pandemia. Ela afirma que as várias ligações para a polícia e diversas reclamações de vizinhos sobre a aglomeração no local não surtem efeito.

“Essa festa já acontecia antes da epidemia, mas só a noite. Agora, é durante o dia. Eles param os carros na calçada, de forma irregular, fazem xixi no meio da rua, deixam garrafa de cerveja espalhada”, conta, dizendo que passou a dormir na sala de casa por causa do barulho que chegava ao seu quarto.

A médica conta que ao ir à festa reclamar do barulho foi ignorada pelos frequentadores, sendo motivo de chacota. Ela quebrou o retrovisor e riscou o para-brisa de um Mini Cooper branco que estava estacionado na calçada para chamar a atenção deles, quando os agressores se aproximaram.

“Eu sai correndo, mas eles vieram atrás e me agarraram em frente ao Hospital Italiano. Fu arrastada de volta para o portão da festa, com eles me agredindo”, relembra, os cerca de 150 metros percorridos. “Teve um momento em que um deles disse ‘pega o carro, que vamos dar sumiço no corpo dela’. Nessa hora, eu gritei desesperadamente”.

CHANTAGEM

As agressões só pararam quando uma frequentadora da festa e dois vizinhos interviram. A médica afirma que apesar da presença de PMs do 6º BPM (Tijuca), que chegaram momentos depois, não se sentiu amparada.

“O dono do carro que eu quebrei o retrovisor disse que era policial. Pegou a carteira de identificação dele e esfregou literalmente no meu rosto”, afirma, dizendo não se lembrar bem da veracidade do documento. “Ele ainda me chantageou, pedindo R$ 6 mil para não me denunciar por quebrar o carro dele”.

Ticyana alega ter negado pagar qualquer valor e que os PMs que ali estavam apenas sugeriram levá-la a um hospital próximo. Ela acabou procurando atendimento médico, com a ajuda de vizinhos, no Hospital Rios D’Or, na Freguesia, na Zona Oeste.

Na unidade de saúde, foi constatado que ela pode ter tido rompimento dos ligamentos do joelho esquerdo. De acordo com a médica, os colegas de profissão aguardam uma melhora em seu quadro para avaliar uma possível cirurgia no local.

“Eu estou cheia de hematomas pelo corpo, com o pescoço machucado e à base de remédios, porque toda hora me lembro do momento em que fui puxada pela rua”, lamenta.

‘PERDI A FÉ NA HUMANIDADE’

A médica ainda não sabe se vai procurar ajuda da polícia. Com medo de represálias, ela deixou sua casa com o filho de dois anos.

Ticyana expôs o caso no Facebook e até a publicação da reportagem, a postagem tinha mais de 10 mil compartilhamentos, 1 mil comentários e passava de 20 mil reações.”Falar foi a forma que encontrei de achar proteção. Se acontecer alguma coisa comigo, as pessoas já vão saber quem foi”, avalia. “Foi crueldade demais o que eu sofri, eu perdi a fé na humanidade. Eu estou com muita desesperança”.

Fonte: O Dia