Jornal Povo

Deputados protocolam pedido para que MP investigue fala de Sérgio Camargo: ‘Escoria maldita’

BRASÍLIA E RIO — Foi protocolado nesta quarta-feira (3), na Câmara dos Deputados, um pedido para que o Ministério Público Federal (MPF) instaure inquérito para investigar a fala do presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, em que ele classifica o movimento negro como “escória maldita”, segundo áudio gravado em uma reunião em abril e revelado nesta terça-feira.

O pedido de abertura de inquérito leva a assinatura de parlamentares de partidos de esquerda, como PSOL, PT, PDT e PSB, com a presença de deputados negros, como Áurea Carolina (PSOL/MG), Benedita da Silva (PT/RJ), Talíria Petrone (PSOL/RJ), Bira do Pindaré (PSB/MA), Damião Feliciano (PDT/PB), David Miranda (PSOL/RJ) e Orlando Silva (PCdoB/SP).

Além da representação ao MPF, o PSOL também protocolou um requerimento para que Sérgio de Camargo preste esclarecimentos no plenário da Câmara dos Deputados sobre as declarações.

A ONG Educafro (Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes) enviou uma representação ao MPF em que acusa o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, de ter cometido crime de racismo ao afirmar que praticantes e organizações ligadas a religiões de matriz africana não vão receber benefícios e recursos enquanto ele estiver à frente da gestão.

Durante a reunião, cujo áudio foi revelado pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, Camargo reclamou de vazamento de informações da Fundação Palmares e prometeu retaliações: “Tem gente vazando informações aqui para a mídia, vazando para uma mãe de santo, uma filha da puta macumbeira, uma tal de mãe Baiana, que ficava aqui infernizando a vida de todo mundo (…) Não vai ter nada para terreiro na Palmares, enquanto eu estiver aqui dentro. Nada. Zero. Macumbeiro não vai ter nem um centavo”.

‘Discriminação odiosa’

O presidente da Fundação Palmares também chamou os integrantes do movimento negro de “vagabundos”. Para a Educafro, Camargo manifestou “discriminação odiosa” e violou a lei, que prevê reclusão de um a três anos para quem “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”.

“Desta forma, cabe ao Ministério Público, encarregado da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, combater a discriminação racial que, além de perigosa, impede a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. Diante do exposto, considerando que os fatos acima narrados caracterizam o crime de racismo e ofensa à legislação supramencionada, a EDUCAFRO requer ao Ministério Público Federal a adoção das providências cabíveis, especialmente com a propositura da competente ação penal”, escreve a Educafro na representação.

Com o documento em mãos, caberá ao MPF decidir se vai abrir uma investigação para apurar o caso. O presidente da Educafro, Frei David, afirmou que Camargo insiste em fazer “provocações” ao movimento negro:

– A Educafro ficou muito surpresa ao ver que, justamente no momento em que mundo inteiro está debatendo e fazendo passeatas exigindo respeito à diversidade e reconhecimento da tortura histórica que várias sociedades fizeram contra o povo negro, esse senhor (Camargo) reitera essa fala de provocação.

Para oadvogado Renato Ferreira, mestre em políticas públicas e pesquisador das relações raciais, Camargo foi nomeado por questões ideológicas e usa os ataques ao movimento negro para tirar o foco dos próprios problemas da gestão:

– Como não tem política pública e parece que não quer aprender, fica criando esses factoides para desviar o foco. Neste momento, milhares de famílias quilombolas estão desassistidas e desamparadas por causa da Covid-19. A lei fala que a missão da Fundação Cultural Palmares é apoiar essas comunidades, mas qual a proposta dele (Camargo) nesse momento em que todo mundo sabe que essas pessoas são mais atingidas, em função da vulnerabilidade social? Ele está em silêncio (sobre esse tema), e a população quilombola está morrendo.

A Fundação Palmares foi procurada, mas ainda não respondeu.

Fonte: O Globo