Jornal Povo

Governador do Rio quer se reunir com deputados para apresentar defesa contra impeachment

RIO – Diante da derrota esmagadora que a Alerj impôs anteontem a Wilson Witzel, com 69 votos a zero a favor da abertura do processo de impeachment, o governador planeja trabalhar em duas frentes para evitar a perda do cargo. Primeiro, pretende chamar todos os deputados ao Palácio Guanabara, individualmente ou em grupos, para apresentar sua defesa. Paralelamente, revelam interlocutores, vai oferecer mais espaço no governo aos parlamentares, tendo em vista que muitos dos que votaram já têm indicações para cargos na gestão estadual.

— Uma iniciativa complementa a outra. Não adianta oferecer espaço ao deputado se ele não puder apresentar ao seu eleitor uma justificativa plausível para votar contra o impeachment. Por isso estamos elaborando uma defesa técnica, robusta, contrapondo a denúncia — avalia um aliado do governador.

O estopim para o pedido de abertura do processo foram as denúncias de fraudes nas compras de respiradores e em obras de hospitais de campanha. Witzel terá uma dificuldade extra para recompor sua base na Alerj. À frente da articulação política, o vice-governador, Cláudio Castro (PSC), anda se queixando com pessoas próximas de que é alvo de fogo amigo de assessores de Witzel. O círculo do governador estaria produzindo um dossiê sobre a vida de Castro e expondo informações comprometedoras, uma vez que o vice seria visto como uma ameaça, por estar na linha de sucessão. Castro não acha que a iniciativa tenha o dedo de Witzel, mas de pessoas da confiança do governador.

Ontem, em entrevista ao ‘‘RJTV’’, da TV Globo, Witzel negou que vá negociar cargos no governo para poder prosseguir no mandato.

— Minha relação será republicana. Não vamos trocar cargos por votos — frisou.

Votação de abertura de processo de impeachment do governador foi por videoconferência.
Votação de abertura de processo de impeachment do governador foi por videoconferência. Foto: Reprodução

Na Assembleia, a expectativa é que o impeachment só seja votado em outubro, por conta de todos os trâmites burocráticos envolvidos, como formações de diferentes comissões e audiências de acusação e defesa. Por conta dessa demora, muitos deputados, de oposicionistas a governistas, avaliam que, antes de o processo chegar ao fim na Alerj, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), instância na qual Witzel responde, selará o destino do governador.

— As próximas decisões da Justiça serão cruciais para ver que lado a Alerj vai seguir em relação ao impeachment. Pode ser que atenue, mas o mais provável é que o clima continue inflamado — avalia Jorge Felippe Neto (PSD), que afirma ser neutro em relação ao Palácio Guanabara.

Aliados dão versão diferente para votação a favor da denúncia

Na entrevista ao ‘‘RJTV’’, da TV Globo, o governador afirmou que incentivou os quatro deputados de seu partido, o PSC, a votarem pela abertura do impeachment, pois o processo daria a ele a oportunidade de apresentar os seus argumentos à Alerj:

— Eu orientei meu partido a votar sim. Não participei de nenhum ato ilícito. Respeito o parlamento e ele vai me julgar. O parlamento é que fiscaliza minhas contas. Recebo essa situação com absoluta tranquilidade. A comissão vai avaliar as provas e certamente levará ao arquivamento do processo.

Deputados da legenda ouvidos pela emissora, contudo, deram outra versão. Contam que explicaram a Witzel que, diante da derrota esmagadora que se aproximava, não seriam os únicos a votar contra a denúncia. Witzel, então, compreendeu e não se opôs à decisão do quarteto.

O presidente da Alerj, André Ceciliano (PT), publicará segunda-feira, no Diário Oficial, a abertura do processo de impeachment, dando 48 horas para que cada um dos 26 partidos indique um representante para a Comissão Especial que analisará a admissibilidade da denúncia em até cinco sessões.

Para a denúncia ser aceita, são necessários 36 votos. Caso isso aconteça, Witzel será afastado temporariamente e julgado por uma comissão presidida pelo presidente do Tribunal de Justiça, Cláudio de Mello Tavares, e composta por dez deputados e dez desembargadores.

Começa disputa interna para ser membro do tribunal especial

No PSL, partido com nove deputados estaduais que concentra bolsonaristas e uma ala mais próxima ao governador Wilson Witzel, já existe uma disputa interna pela indicação para compor a Comissão Especial.

— Acredito que, por eu ter apresentado denúncias mostrando a situação dos hospitais de campanha, meu nome deve ser indicado. Meus colegas de bancada Rodrigo Amorim, Gustavo Schmidt e Alexandre Knoploch eram, até bem pouco tempo, da base do governo — disse Filippe Poubel.

A maioria dos partidos definirá o nome na segunda-feira. O processo de impeachment não deve terminar em menos de quatro meses. A estimativa é do deputado Luiz Paulo, que assinou, com Lucinha (ambos são do PSDB), o pedido de afastamento aprovado em votação simbólica na Alerj. O motivo da demora se deve aos prazos, rituais e proximidade do recesso de meio de ano. A previsão é que a Alerj suspenda os trabalhos provavelmente no dia 1º, após a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias.

Witzel cita ‘problema mental’ da população para justificar flexibilização

Para justificar a decisão de flexibilizar as medidas de restrição adotadas para conter a epidemia da Covid-19, o governador disse ontem, na entrevista ao ‘‘RJTV’’, que um dos motivos “foi a preocupação com a saúde mental da população fluminense”:

— As pessoas têm o problema mental de ficar em casa, enclausuradas, sem fazer exercícios. Diante dos dados que temos de ocupação de leitos de UTI chegamos à conclusão de que podíamos abrir a economia — afirmou.

Hospital de Campanha do Maracanã é o único do estado em funcionamento, mas parcialmente.
Hospital de Campanha do Maracanã é o único do estado em funcionamento, mas parcialmente. Foto: Gabriel de Paiva / 03.06.2020

No dia em que o estado registrou 75.775 casos da doença e 7.363 mortes, e ainda sem prazo para abrir seis dos sete hospitais de campanha, o governador anunciou que as unidades não vão mais atender as vítimas do novo coronavírus. Quando ficarem prontas, receberão pacientes para cirurgias eletivas, boa parte das quais foram adiadas nos últimos meses porque os leitos nas unidades convencionais foram convertidas para tratar a Covid. Apesar de ter apenas a unidade do Maracanã em funcionamento, porém não plenamente, Witzel disse que a sua atuação para combater a epidemia foi “absolutamente eficiente’’.

O governador também pediu desculpa à população pelos erros cometidos que, segundo ele, foram de responsabilidade da organização Iabas, que chamou de ‘‘inescrupulosa’’. E apesar de o Tribunal de Contas do Estado (TCE) ter constatado superfaturamento de R$ 123 milhões apenas nas compras de respiradores, durante a entrevista, o governador disse que as denúncias de sobrepreço ainda não foram comprovadas.

Em nota, o Iabas disse que ‘‘inescrupulosa é a forma como o governo do Rio de Janeiro trata a saúde pública’’, e que “demonstrará e comprovará essa afirmação na Justiça”.

Fonte: Jornal Extra