Jornal Povo

PESQUISA APONTA FILHOS E TRUCULÊNCIA COMO FATOR DE ARREPENDIMENTO NO VOTO EM BOLSONARO

Acaba de sair do forno mais uma pesquisa qualitativa da socióloga Esther Solano, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da Universidade Complutense de Madri, com eleitores de Jair Bolsonaro em 2018, desta vez focada em como o presidente e seu governo estão sendo vistos por quem o elegeu e não nas razões do voto, como em seus estudos anteriores, de que tratei aqui em duas colunas no começo do ano.

Solano, desta vez em dupla com a também socióloga Camila Rocha, entrevistou, entre 9 e 18 de maio, 27 eleitores do presidente, 12 homens e 15 mulheres, das classes C e D e residentes na Região Metropolitana de São Paulo.

Com duração de até três horas e meia, as entrevistas de profundidade permitiram que se iluminassem nuances do apoio a Bolsonaro que pesquisas quantitativas não costumam alcançar. A partir disso, as duas traçaram três perfis de eleitores: os fiéis, que manifestam apoio permanente; os críticos; e os arrependidos, que se decepcionaram com o capitão.

Com os três tipos, conversaram sobre a presença dos filhos no governo, a demissão dos ministros, a reação de Bolsonaro à pandemia, seu jeito truculento de ser, entre outros temas.

A primeira parte da pesquisa buscou entender como é vista a situação política atual, e surgiram três razões que causariam instabilidade ao governo. Primeiro, um boicote a Bolsonaro por parte da imprensa e do Congresso.

Frases com o sentido de “Deixa o homem trabalhar” foram recorrentes entre os fiéis. Os apoiadores críticos admitiram que Bolsonaro não está fazendo um governo como esperado, mas o veem como “honesto”, “autêntico”, “sincero”, sendo sempre boicotado, uma ideia que perde força entre os arrependidos.

Uma segunda percepção como fator de instabilidade, comum a fiéis, críticos e arrependidos, foi a de que os filhos do capitão com cargos políticos mais atrapalham do que ajudam. Flávio, Carlos e Eduardo Bolsonaro são qualificados, nas palavras dos entrevistados, como “moleques”, “despreparados” e suspeitos de envolvimento em atividades ilegais.

Segundo as pesquisadoras, frases como “não boto a mão no fogo por eles” e “aí tem coisa” apareceram com frequência. Ainda que os filhos possam ser vistos como corruptos, Bolsonaro é tido como honesto e, por isso, os filhos teriam de se responsabilizar sozinhos por eventuais atividades ilegais, sem comprometer o pai.

“Hoje ele vive para salvar a pele dos filhos. É rachadinha de um, o outro só posta besteira na internet. (…) O problema é o que ele trouxe junto, são os filhos que têm problema. E para defender os filhos, ele está estragando todo o plano de governo dele”, disse um dos críticos, de 45 anos.

Uma minoria disse entender que ele age em defesa dos filhos por ser pai, enquanto a maioria considerou que deveria haver uma separação entre a figura paterna e a de presidente, prevalecendo o papel público.

A terceira fonte política de instabilidade bastante citada foi a postura do presidente, descrita como “rude”, “bruta”, sem “decoro”. Para os bolsonaristas fiéis, sua forma de se dirigir ao público seria positiva, resultado da autenticidade de quem não se deixa influenciar pelo marketing ou pela falsidade associada a políticos tradicionais.

“O Bolsonaro é muito a cara do tio brasileiro, que vai numa reunião de família e expressa a opinião dele, vai falar palavrão, vai mandar tomar no c…, vai mandar calar a boca, e o Brasil estava precisando de um cara assim!”, elogiou um bolsonarista fiel de 32 anos.

Entre os apoiadores críticos, o estilo violento seria inadequado e criador de instabilidade, mas, ainda assim, melhor do que a polidez de políticos tradicionais desonestos. Os arrependidos veem seu jeito como incompatível com a Presidência.

Fonte: Época