Jornal Povo

Milícia estaria controlando fábrica ilegal de cigarros na Baixada Fluminense

O mercado ilegal de cigarros ganhou mais um componente no Rio: a Polícia Civil investiga a informação de que milicianos do maior grupo paramilitar do estado estão produzindo seu próprio fumo para ser vendido em estabelecimentos comerciais. De acordo com dados levantados pelo JP, há suspeitas de que fábricas clandestinas funcionem nos bairros de Santíssimo e Sepetiba, na Zona Oeste do Rio. Detalhes da investigação são mantidos em sigilo. O objetivo da milícia é aumentar os lucros com a venda de cigarros, optando por outra alternativa além da revenda dos contrabandeados do Paraguai.

A disputa por esse mercado ilegal movimentou R$ 764 milhões no estado em 2019, segundo pesquisa do Ibope Inteligência, e, além dos milicianos, também envolve o tráfico e a contravenção. O Ibope considera ilegais os cigarros contrabandeados e também aqueles que são vendidos pelos comerciantes abaixo dos R$ 5 estabelecidos em lei, alguns deles produzidos em duas fábricas com endereço em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. São elas a Quality In e a Cia Sulamericana. A primeira produz o Gift brasileiro, facilmente confundido com o produto paraguaio, e a segunda, disputa esse mercado fabricando o Club One.

Na internet, é possível encontrar anúncios de tabacarias vendendo pacotes com dez maços dos cigarros fabricados pelas marcas a preços variando entre R$ 30 e R$ 35. Com esses valores, cada maço custa entre R$ 3 e R$ 3,50, abaixo do mínimo estipulado em lei.

A polícia na casa usada como depósito de cigarros da milícia em Duque de Caxias
A polícia na casa usada como depósito de cigarros da milícia em Duque de Caxias Foto: Divulgação

O presidente do Fórum Nacional contra a Pirataria e Ilegalidade, Edson Vismona, afirma que a fabricação de cigarros de forma clandestina, como vem sendo feito pelos milicianos, é uma prática comum entre os criminosos. Ele relembra que em maio do ano passado, a Polícia Civil de São Paulo estourou um local onde era produzido ilegalmente fumo para consumo nas cadeias.

— O mercado de cigarros está sendo dominado pelo crime. Atualmente, é a venda de cigarros que financia o crime organizado — analisa Vismona.

O estudo do Ibope Inteligência revela que o cigarro contrabandeado corresponde a 41% de todos os que circulam no estado do Rio. Investigações apontam que apesar das suspeitas de estarem com produção própria, os milicianos ainda tem forte atuação nesse mercado. O ex-policial militar Ronaldo Santana da Silva é acusado de ser o principal fornecedor do grupo paramilitar dominado por Wellington da Silva Braga, o Ecko.

Segundo as investigações, o ex-PM, atualmente em prisão domiciliar, tinha o monopólio da venda de cigarros paraguaios para os milicianos. No país vizinho, o cigarro é adquirido, em média, por R$ 0,70. No Rio, é vendido por cerca de R$ 3,50.

De acordo com investigações da Polícia Civil, o mercado de cigarro contrabandeado era disputado com Santana pelo policial civil Claudézio de Souza Gomes, morto na Pavuna, em outubro de 2018. O agente assassinado era responsável pela distribuição na feira do bairro, mas tentava expandir seus domínios.

As linhas de investigação para o crime não ficam restritas a essa rivalidade. Claudézio também acumulava dívidas com fornecedores e era investigado por ter roubado uma carga de cigarros produzidos pela Quality In usando seu próprio carro.

Assassinatos sob suspeita

Nos dois primeiros meses deste ano, em um intervalo de menos de um mês, outros três homens que tinham ligação com a feira da Pavuna e a comercialização de cigarros foram mortos. A polícia investiga se os crimes tiveram conexão com disputas pelo mercado do cigarro ilegal. No dia 24 de janeiro, Gerson Luiz Silveira, o Zinho, foi assassinado dentro de sua própria casa, na comunidade do Chapadão.

Segundo informações obtidas pelo EXTRA, Zinho era dono de dois depósitos de cigarros localizados na feira da Pavuna. Logo após a morte de Gomes, ele passou a dominar o mercado de fornecimento de cigarros – principalmente contrabandeados – na região. No entanto, antes de ser morto, ele deixou de comercializar os produtos paraguaios e vinha investindo nos cigarros produzidos em território fluminense.

Na comunidade onde Zinho morava, de acordo com informações da Polícia Civil, são vendidos nos comércios cigarros contrabandeados da marca Gift. Tudo com o aval do tráfico de drogas local, comandado pela maior facção criminosa do estado.

No dia 5 de fevereiro, David Pereira da Silva, conhecido como David Show, de 42 anos, foi executado no centro de Meritie. Ele também tinha um negócio de venda de cigarros na feira e acumulava diversas dívidas com fornecedores. Oito dias depois, o bombeiro reformado Edson de Souza foi assassinado dentro de seu carro, na Pavuna. Ele era um dos responsáveis pela segurança da feira e mantinha estreita ligação com David.

Fonte: Jornal Extra