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Morte de inocente, pânico, sequestro: Entenda o rastro de terror no Rio

O Rio de Janeiro vivencia 24 horas de pânico e terror em decorrência da guerra entre facções pelo controle de favelas na região central da cidade. Da tarde desta quarta-feira, dia 26, até a manhã desta quinta-feira, dia 27, houve confronto na Lagoa e no Humaitá, na Zona Sul, um forte tiroteio no Complexo do São Carlos, que resultou em uma mulher morta quando tentava proteger o filho de tiros, e um criminoso em fuga, que fez uma família de refém nesta madrugada, em um condomínio no Rio Comprido, na Zona Norte.

No início desta tarde, uma intensa troca de tiros voltou a ocorrer na região, e um segundo sequestro aconteceu próximo às comunidades. Depois de quase uma hora, por volta das 16h, quatro traficantes foram presos e refém libertado. Até o momento, duas pessoas morreram e nove ficaram feridas, além de bandidos presos, durante a série de horror na capital.

Segundo a polícia, durante intenso tiroteio, criminosos fugiram a pé e se esconderam dentro de um apartamento, na tarde desta quinta-feira. Snipers ficaram posicionados no prédio ao lado. Ao fim, os quatro sequestradores foram presos. De acordo com o porta-voz da Polícia Militar, o coronel Mauro Fliess, havia uma mulher na casa, mas os PMs ainda estão fazendo uma revista para averiguar se há mais bandidos ou moradores. A informação oficial, por ora, é a de que uma mulher era mantida refém. Ela não foi ferida e já está em segurança.

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O porta-voz da Polícia Militar, coronel Mauro Fliess, informou que a sequência de confrontos está interligada à tentativa de invasão de bandidos da Rocinha ao Morro da Mineira, comunidade localizada no Complexo do São Carlos.

—  Isso tudo começou ontem (quarta-feira) de dia, com aquela ocorrência acompanhada por todos, na Lagoa, quando criminosos saindo da Rocinha possivelmente, até pelo farto armamento que tinham ali, estavam se dirigindo para reforçar a disputa territorial no Centro da cidade. Durante a noite, inicia-se um confronto entre esses grupos criminosos e foi necessária uma intervenção rápida e enérgica da Polícia Militar —  disse o oficial à “TV Globo”.

Confira como tudo aconteceu

Confronto na Lagoa

Na tarde de quarta-feira, dia 27, um tiroteio seguido de perseguição causou pânico no Humaitá e na Lagoa, na Zona Sul do Rio. A ação começou em frente à Paróquia São José da Lagoa, na Lagoa, quando agentes da Divisão de Homicídios da Capital avistaram homens armados em uma Duster branca. Uma troca de tiros começou, e os criminosos roubaram um outro carro para tentar fugir dos agentes, mas foram interceptados por policiais do 23º Batalhão (Leblon) e do Segurança Presente. Os criminosos abandonaram o segundo carro e se dividiram.

Artefatos bélicos foram encontrados dentro de carro roubado na Lagoa Foto: Divulgação
Artefatos bélicos foram encontrados dentro de carro roubado na Lagoa Foto: Divulgação

Os ocupantes do carro fugiram pelo Túnel Rebouças. Um homem chegou a ser capturado pelos policiais dentro da Lagoa Rodrigo de Freitas. Um dos presos chegou a ser baleado e foi atendido no Hospital Miguel Couto e levado, no início da noite, para a DH da capital (Barra). Durante a perseguição, um policial em uma motocicleta sofreu um acidente e caiu do veículo. Ele se feriu superficialmente no joelho.

Um outro criminoso subiu na garupa de uma moto e tentou escapar pela Rua Pio Correa, perto da entrada do Rebouças, causando correria entre os moradores da via. Ele chegou a ordenar a um porteiro para deixá-lo entrar em um prédio. Policiais militares cercaram a rua e o prenderam.

Um dos presos, ainda sem identificação, chegou a ser baleado, foi atendido no Hospital Miguel Couto e levado,no início da noite, para a DH da capital (Barra) Foto: Divulgação
Um dos presos, ainda sem identificação, chegou a ser baleado, foi atendido no Hospital Miguel Couto e levado,no início da noite, para a DH da capital (Barra) Foto: Divulgação

A policia investiga a informação de que o grupo estava a caminho do Morro da Mineira para participar de uma guerra entre facções, que ocorreu horas depois. Os agentes da Operação Lagoa Presente também apreenderam 14 granadas, uma pistola Glock, munições de fuzil, nove carregadores de fuzil, porta-carregadores de fuzil e dois radiocomunicadores dentro de um dos carros roubados.

Confronto no Complexo do São Carlos

No início da noite, um forte e intenso tiroteio assustou moradores da região do Catumbi e do Complexo do São Carlos, na Região Central do Rio. Os relatos nas redes sociais, que começaram por volta das 18h, citavam uma intensa troca de tiros, de grosso calibre, entre traficantes rivais na região do Morro da Mineira, num horário em que muitos estão voltando para casa do trabalho.

Conforme a PM, equipes do 5º BPM (Praça da Harmonia) que faziam um cerco no Catumbi entraram em confronto com bandidos. Um deles foi localizado ferido e socorrido ao Hospital Municipal Souza Aguiar. Com ele, foram apreendidos uma pistola, um carregador, granada e colete. Dois carros também foram recuperados.

Um dos vídeos publicados nas redes sociais, que mostram intenso tiroteio Foto: Reprodução
Um dos vídeos publicados nas redes sociais, que mostram intenso tiroteio Foto: Reprodução

Já nas comunidades Mineira e São Carlos, disparos foram feitos e houve lançamento de artefatos explosivos contra policiais do Batalhão de Polícia de Choque (BPChq). Houve mais um confronto e suspeito foi encontrado ferido e socorrido ao Hospital Souza Aguia. Houve apreensão de três fuzis, uma pistola, carregadores, munições, oito granadas, bombas artesanais e drogas. Um policial do Choque ficou ferido e foi socorrido ao Hospital Central da Polícia Militar. Seu estado de saúde é considerado estável.

Outras três pessoas feridas deram entrada no Hospital Municipal Souza Aguiar (HMSA). Uma delas foi a jovem Ana Cristina da Silva, de 25 anos. A atendente chegou a dar entrada com vida, mas não resistiu aos ferimentos. Ela tentava proteger o filho quando foi ferida.

Ainda nesta intervenção, até o momento, foram apreendidos cinco fuzis, três pistolas, artefatos explosivos e munições.

Mulher morta

O confronto no Complexo do São Carlos deixou uma mulher morta por bala perdida e três pessoas feridas — entre elas um morador, um policial militar do Batalhão de Choque e um suspeito. A atendente Ana Cristina da Silva, de 25 anos, morreu após ser atingida por dois tiros. Ela chegou a ser encaminhada para o Hospital municipal Souza Aguiar, no Centro, mas não resistiu aos ferimentos.

Ana Cristina da Silva, de 25 anos, morreu após ser atingida por dois tiros Foto: Reprodução/TV Globo
Ana Cristina da Silva, de 25 anos, morreu após ser atingida por dois tiros Foto: Reprodução/TV Globo

Segundo a cunhada de Ana Cristina, ela seguia para o bar onde trabalhava com o filho de 3 anos quando ficou no meio do fogo cruzado. Para proteger a criança, a atendente se jogou sobre o filho e acabou sendo atingida por tiros de fuzil na cabeça e na barriga.

— Para salvar a vida dele, ela o cobriu e foi baleada duas vezes. A gente pensa que nunca vai acontecer com a gente, mas de uma hora pra outra você morre pra salvar a vida de um filho. Então, eu acho que não tem mensagem pra deixar, só tem indignação, só tem um pedido, né: Justiça pra ser feita — disse Vânia Brito, cunhada da vítima, ao “Bom dia Rio”, da TV Globo.

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Primeiro sequestro

Já na madrugada desta quinta-feira, um bandido manteve por mais de cinco horas moradores de um apartamento reféns, no Rio Comprido, na Zona Norte do Rio. O criminoso estava fuga do Complexo de São Carlos, junto com outros quatro bandidos, quando trocou tiros com agentes do 4º BPM (São Cristóvão), BPChq e RECOM. Dos cinco, um morreu, outros dois ficaram feridos, e um quarto chegou a fugir, mas foi detido durante uma vasculha dos agentes. Ele estava com carregadores de fuzil, que foram apreendidos. O quinto integrante, Renan Fortunato do Couto, invadiu um prédio.

O bandido rendeu três pessoas, por volta das 2h, em uma cobertura da Rua Aristides Lobo. Uma delas foi liberada com um ferimento leve numa das pernas. Renan Fortunato do Couto manteve uma mulher, a filha pequena e a mãe, idosa, reféns até as 7h10, quando se entregou.

Um suspeito morreu em confronto com a polícia na Rua Aristides Lobo, no Rio Comprido Foto: Gabriel de Paiva / O Globo
Um suspeito morreu em confronto com a polícia na Rua Aristides Lobo, no Rio Comprido Foto: Gabriel de Paiva / O Globo

Negociadores do Batalhão de Operações Especiais (Bope) fizeram contato com o bandido que mantinha a mulher e a criança sob ameaça. Um irmão do sequestrador foi ao local para ajudar nas negociações e disse que a família é do Morro do Cantagalo, em Copacabana, na Zona Sul. Ao invadirem o prédio, um dos criminosos baleou o porteiro. Segundo uma moradora, ele está sendo operado no Hospital Souza Aguiar, no Centro.

Homem manteve reféns uma mulher e uma criança no início da manhã desta quinta-feira, (27) após noite de conflitos no Rio Comprido. Vítima conta como foram os momentos no apartamento; invasão ocorreu na madrugada
Homem manteve reféns uma mulher e uma criança no início da manhã desta quinta-feira, (27) após noite de conflitos no Rio Comprido. Vítima conta como foram os momentos no apartamento; invasão ocorreu na madrugada

Segundo um morador, o homem que manteve a família refém estava trocando tiros com policiais na rua instantes antes de entrar no condomínio. Ele subiu até o 17º andar, onde entrou num apartamento. Agentes do Batalhão de Polícia de Choque (BPChq) fazem buscas em prédios nas proximidades do Complexo de São Carlos em busca de bandidos que possam estar escondidos. A Rua Aristides Lobo foi interditada ao trânsito, foi reaberta, mas novamente interditada por conta de um novo intenso tiroteio na região no início da tarde desta quinta-feira.

Moradora do imóvel invadido ficou por cerca de cinco horas com o homem até ele se render
Moradora do imóvel invadido ficou por cerca de cinco horas com o homem até ele se render

Com o criminoso, foram apreendidos uma pistola calibre .40 com “kit rajada”, carregadores e cinco rádios comunicadores. Mas a PM ainda apreendeu dois fuzis, uma granada e uma pistola, além de munições com os demais bandidos.

Novo tiroteio

No início da tarde desta quinta-feira, moradores do Rio Comprido, na região central do Rio, voltaram a viver momentos de pânico na tarde desta quinta-feira. Por volta de meio-dia, um novo confronto começou na comunidade. Em razão desse tiroteio, a Rua Aristides Lobo foi novamente interditada ao trânsito por volta de 12h30 — a via havia ficado fechada ao trânsito durante a manhã.

Um criminoso fez três pessoas de reféns, no Rio Comprido. Outro bandido morreu em tiroteio com policiais Foto: Gabriel de Paiva / O Globo
Um criminoso fez três pessoas de reféns, no Rio Comprido. Outro bandido morreu em tiroteio com policiais Foto: Gabriel de Paiva / O Globo

Equipes dos batalhões de Operações Especiais (Bope) e de Polícia de Choque (BPChq) estão no conjunto de favelas. A Polícia Militar ainda não informou se o confronto é entre bandidos rivais ou se é entre PMs e criminosos.

Segundo sequestro

Um novo sequestro deu continuidade às 24 horas de terror. Desta vez, cinco bandidos fazem uma família refém na Rua Maia de Lacerda, no Estácio, próximo ao Complexo do São Carlos. Por volta das 13h30, a Polícia Militar passou a vasculhar casas atrás de traficantes que estariam fazendo moradores reféns. Os PMs descobriram que um bando estaria mantendo outras pessoas reféns em um condomínio, perto do prédio onde aconteceu o primeiro caso na manhã desta quinta-feira.

Movimentação de policiais em frente a prédio onde criminosos fazem novos reféns no São Carlos Foto: Rafael Nascimento de Souza/O Globo
Movimentação de policiais em frente a prédio onde criminosos fazem novos reféns no São Carlos Foto: Rafael Nascimento de Souza/O Globo

De acordo com parentes dos reféns, uma mulher, seu pai e seu tio estão sob custódia de seis homens armados. Policiais confirmam a presença de cinco sequestradores, mas não informaram o número total de reféns. Uma ambulância da PM e um blindado dão apoio. Segundo os políciais, no momento do intenso tiroteio, criminosos fugiram correndo a pé e se esconderam dentro do apartamento.

Após notar que a residência estava cercada, os criminosos ligaram para seus familiares pedindo a presença da imprensa e de advogados.