Jornal Povo

Crivella é citado como ‘Zero Um’ em conversa entre empresário e doleiro em suposto esquema de corrupção, diz MPRJ

O Ministério Público do Rio investiga se o prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, se beneficiou diretamente do suposto esquema de corrupção comandado pelo empresário Rafael Alves. Em uma troca de mensagens com o doleiro Sérgio Mizrahy, gravada em 2018, ele faz cobranças sobre o atraso de um determinado pagamento, dizendo que este seria direcionado ao “Zero Um”.

Para o Ministério Público, o “Zero Um” seria Crivella.

  • Rafael Alves: “Ok, só preciso dos 22.900 até amanhã, 12 horas s e zera.”
  • Mizrahy: “Já, já.”
  • Em outro momento, Rafael faz a cobrança novamente: “Oi, o que resolveu dos 22.900?”
  • Mizrahy: “Tudo certo! Celso já vai te ligar, ele está indo para a Cidade das Artes com Edimilson”.

O MPRJ afirma que “Celso” é o empresário Celso Cury, um amigo em comum entre Rafael Alves e Sérgio Mizhray.

Segundo os promotores, Celso tinha conhecimento das transações ilícitas, tanto que indicou os serviços do doleiro Sérgio Mizrahy e participou de alguns repasses de dinheiro envolvendo Rafael Alves e o prefeito Marcelo Crivella.

Na troca de mensagens, como o pagamento não foi feito naquele dia, o empresário Rafael Alves mostra irritação.

Rafael Alves: “Já não é a primeira vez que isso acontece. Isso é vacilo! Parada para o Zero Um. Vamos aguardar”

Segundo os promotores, “Sérgio Mizrahy afirmou que Rafael Alves se referia ao prefeito Marcelo Crivella como 01 (zero um) e que, em determinada transação financeira realizada em março de 2018, restou explícito em mensagens trocadas pelo aplicativo Whatsapp que certa quantia em dinheiro seria destinada ao prefeito”.

Nas palavras do MP, “não há dúvidas de que Rafael Alves exerce grande influência sobre o atual mandatário do poder executivo do município do Rio de Janeiro”.

Essa relação não é de hoje – e aparece na delação Mizrahy, preso em 2018 num desdobramento da Operação Lava-Jato.

Em depoimento, o doleiro-colaborador disse que Rafael Alves arrecadou dinheiro de empresas para a campanha de Crivella, em 2016.

E que, depois que Crivella assumiu a prefeitura, o empresário transformou a Riotur – empresa de turismo da prefeitura – num ‘QG da propina’, mesmo sem ter um cargo oficialmente.

A delação aponta que Rafael tinha uma sala na sede da Riotur, que era presidida pelo irmão dele, Marcelo Alves.

Mizrahy afirmou que Rafael Alves cobrava propina de empresários interessados em fechar contratos com a prefeitura ou então que estavam na fila para receber pagamentos atrasados de serviços já prestados.

Mizrahy confessou que era o responsável por lavar o dinheiro da propina, que era paga semanalmente.

Em março, a Riotur foi um dos alvos de uma operação do MP, que investiga o suposto esquema.

Os promotores afirmam que “nesse contexto, percebe-se que o elevado grau de ingerência de Rafael Alves junto à administração municipal e os estreitos laços pessoais que mantém com o prefeito Marcelo Crivella descortinam fortes indícios da existência de uma bem estruturada organização criminosa que tomou de assalto os cofres públicos, com a possível participação do chefe do poder executivo municipal”

Outro episódio reforça os laços entre Marcelo Crivella e Rafael Alves, segundo os investigadores.

Como a GloboNews mostrou na sexta-feira, enquanto um mandado de busca e apreensão era cumprido na casa de Rafael Alves, em março, o telefone do empresário tocou. O aparelho estava nas mãos de um delegado. Na tela surgiu a identificação do chamador: “prefeito crivella novo 2”.

O delegado atendeu a chamada e imediatamente identificou a voz de Vrivella, que disse: “Alô, bom dia Rafael? Está tendo uma busca e apreensão na Riotur? Você está sabendo?”

Nesta quinta-feira (10), a casa do prefeito foi um dos alvos do Ministério Público. Agora, o celular de Marcelo Crivella está nas mãos dos investigadores.

Lavagem de dinheiro

O Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro (MP-RJ) diz ter encontrado indícios de “bilionárias movimentações atípicas” da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) e afirmou ser “verossímil concluir” que a entidade religiosa está sendo “utilizada como instrumento para lavagem de dinheiro fruto da endêmica corrupção instalada na alta cúpula da administração municipal” do Rio. O prefeito Marcelo Crivella é bispo licenciado da Iurd.

A análise que cita a Universal está presente em documento de 262 páginas, assinado com data de 2 de setembro deste ano, enviado à Justiça pelo Subprocurador-Geral de Justiça de Assuntos Criminais e de Direitos Humanos do MPE-RJ, Ricardo Ribeiro Martins.

Nessa petição, a que o G1 teve acesso, o sub-procurador geral cita a existência de um Relatório de Inteligência Financeira (RIF) do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), órgão vinculado ao Ministério da Fazenda, apontando que a entidade religiosa “foi objeto de comunicação em razão da identificação de movimentações financeiras de R$ 5.902.134.822,00”, entre o dia 5 de maio de 2018 e 30 de abril de 2019.

O Jornal Povo apurou que o RIF reúne informações de vários CNPJ’s da IURJ.

Em outro esquema descoberto pela investigação, o Ministério Público do Rio de Janeiro (MP) que apura a existência de um suposto esquema de corrupção na Prefeitura do Rio apontou que uma das modalidades de fraude existentes era a cobrança de propina das empresas que tinham valores a receber do município.

O esquema, segundo o MP, tinha como objetivo facilitar os pagamentos realizados pelo Tesouro Municipal em favor das empresas “parceiras”. Ou seja, a empresa que pretendia receber sua dívida precisava pagar para furar a fila.

O subprocurador-geral de justiça, Ricardo Ribeiro Martins, descreveu uma série de irregularidades e apresentou provas como transcrições de conversas telefônicas, recibos e tabelas de pagamento. Todo o material foi apreendido na Operação Hades, em março desse ano.

Casa de Romário

O empresário Rafael Alves, que é apontado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro como operador do suposto esquema conhecido como “QG da propina”, intercedeu junto ao prefeito Marcelo Crivella para que uma casa do senador Romário no Rio não fosse demolida.

De acordo com parecer técnico, parte do imóvel localizado na Barra da Tijuca, Zona Oeste, foi construída em uma área irregular. A informação foi publicada pelo jornal O Globo. Por isso, a Secretaria Municipal de Urbanismo defendeu a derrubada da construção. De acordo com os promotores, Alves intercedeu pessoalmente junto a Crivella e impediu a demolição.

Os promotores descobriram que, no dia 15 de março de 2018, Alves enviou mensagens a Crivella sobre o tema – o aparelho do empresário havia sido apreendido naquele mesmo mês. Também em março, um laudo da Secretaria de Urbanismo havia recomendado a demolição.

Fonte: G1