A inesperada eliminação do Fluminense para o Atlético-GO na Copa do Brasil – a segunda desclassificação precoce na temporada depois da queda na primeira fase da Copa Sul-Americana diante do modesto Unión La Calera, do Chile – foi um duro golpe a ser assimilado nas Laranjeiras. Daqueles que levam à lona, fazem o juiz abrir contagem e deixam estragos.
A derrota por 3 a 1 no Estádio Olímpico de Goiânia (veja os lances no vídeo acima), na última quinta-feira, abalou as estruturas de um clube que tenta se reconstruir. A era dourada da época da Unimed, que rendeu os últimos grandes títulos tricolores, acabou no início da década passada. E a realidade atual, bem mais humilde, sofre muito mais com os impactos de tropeços fora da curva.
Impacto financeiro
Os primeiros sintomas da recente eliminação são financeiros e causam um rombo no orçamento. Nos cálculos previstos pela diretoria em 2020, feitos já após a queda na Sul-Americana, foi orçada uma premiação de R$ 11,8 milhões na Copa do Brasil. Para atingir esse valor, o clube precisaria chegar às quartas de final da competição, mas acabou caindo antes mesmo das oitavas. O lucro obtido até a quarta fase do torneio foi de R$ 5,9 milhões, praticamente metade da estimativa.
O orçamento de 2020 calculou um superávit do exercício de R$ 9 milhões. Com R$ 6 milhões a menos do previsto na Copa do Brasil, esse cálculo já cai para R$ 3 milhões, o que ainda fecharia o ano no azul. Mas para isso, o clube precisará atingir outras metas de receita, como por exemplo em venda de jogadores, estimada em R$ 70 milhões. Até o momento, a diretoria obteve pouco menos da metade disso com as saídas de Evanilson (Porto-POR), Gilberto (Benfica-POR), Pitaluga (Liverpool-ING), Orejuela (Querétaro-MEX) e o empréstimo de Marlon (Trabzonspor-TUR): cerca de R$ 33 milhões.
A situação fica ainda pior diante dos salários atrasados. Jogadores e funcionários receberam só 50% de julho, restando ainda o pagamento da outra metade do mês e 100% de agosto – a remuneração de setembro vence em breve, no quinto dia útil de outubro. Além disso, os atletas que recebem direito de imagem estão desde junho sem o pagamento. A diretoria contava com a premiação de R$ 2,6 milhões pela classificação às oitavas para começar a acertar as pendências.
Impacto esportivo
Em campo, o time sofreu um choque de realidade. Uma equipe lenta, espaçada e sem criatividade não é de hoje. Já tinha sido assim nas derrotas para o Sport na Ilha do Retiro e para o São Paulo no Morumbi; e nas sofridas vitórias sobre Atlético-GO e Corinthians no Maracanã. Com esse futebol burocrático, a meta de buscar uma classificação para a Libertadores através do Campeonato Brasileiro soa como utopia.
Como o Fluminense só voltará a jogar a Copa do Brasil em 2021, já serão seis anos sem eliminar um time da Série A no torneio mata-mata.
Nas mãos de Odair, esse time chegou a encaixar durante algumas rodadas do Brasileiro, logo após a vitória sobre o Inter. Mas o time nunca mais foi o mesmo desde a saída do Evanilson e precisa se reinventar. Mas um único jogador faz tanta diferença assim? Para o esquema atual, sim. O Fluminense não tem outro jogador que cumpra as funções de um centroavante rápido e precisa contratar. Enquanto não chega ninguém, é hora de reavaliar sistemas táticos e até mesmo suas peças.
Muriel voltou a falhar. Egídio não transmite confiança na esquerda. Calegari até vinha bem na direita, mas ainda assim é uma improvisação. Hudson não tem conseguido dar a proteção necessária à frente da área. Dodi e Michel Araújo caíram demais de rendimento. Wellington Silva está devendo não é de hoje. Luiz Henrique, por mais promissor que seja, não tem o “cacoete” de centroavante… Talvez o único com status de titular indiscutível ainda seja Luccas Claro.
Impacto sobre trabalho
Odair Hellmann foi contratado com base no seu trabalho de reconstrução do Inter, quando tirou o clube da Série B e levou até a Libertadores. O técnico tem a confiança do presidente Mário Bittencourt e do diretor executivo Paulo Angioni, que inclusive estavam em Goiânia com a delegação tricolor. Mas o foco de insatisfação internamente aumenta em outras frentes no clube.
Nos corredores das Laranjeiras, já há muitos críticos ao trabalho do treinador, ainda mais com opções disponíveis no mercado, como por exemplo Tiago Nunes e Roger Machado. Por ora, Odair continua e inclusive tem indicado reforços para o Fluminense, como por exemplo Danilo Barcelos, que já chegou, e Lucca, que tem negociações avançadas com o clube.
A pressão externa também aumenta. Há duas semanas, um grupo de tricolores fez um protesto com faixas e “gritos de guerra” contra a direção e Odair na porta das Laranjeiras. E na madrugada desta sexta-feira, cerca de 100 torcedores ignoraram a pandemia e foram ao Aeroporto do Galeão para fazer novo protesto na chegada do time, que retornou em voo fretado ao Rio de Janeiro por volta das duas horas da manhã. Outras mobilizações podem acontecer nos próximos dias.
Odair tenta absorver as críticas, evita culpar jogadores por erros individuais e assume a responsabilidade diante das câmeras. Na entrevista coletiva após a eliminação, disse:
– Não responsabilizo jogador, nem o grupo. A responsabilidade é minha pelas decisões. Futebol é um esporte de erros e eu estou atento a todas as situações. Eu tento passar confiança aos jogadores.
Por mais que tenha a confiança da direção, Odair sabe que futebol é resultado. E um novo tropeço diante do Coritiba na próxima segunda-feira, às 20h (de Brasília), no Estádio Nilton Santos, pela 12ª rodada do Campeonato Brasileiro, pode aumentar ainda mais a pressão sobre si.
Fonte: GloboEsporte