Jornal Povo

FAZENDA VIRA REFÚGIO DE ONÇAS FERIDAS DO PANTANAL

Uma propriedade rural no município de Corumbá, em Goiás, se tornou o refúgio de onças em situação de risco. No local funciona a base de operações do Instituto de Preservação e Defesa de Felídeos da Fauna Silvestre do Brasil em Processo de Extinção (NEX).

O NEX é uma organização não-governamental, fundada em 2001, com o objetivo de abrigar animais feridos ou sob algum tipo de risco, direcionadas por centros de triagem do Ibama. Atualmente, a fazenda abriga 22 onças e uma jaguatirica.

O veterinário Thiago Luczinski (à dir.) e a equipe do NEX: equipe voltada para proteção de onças em situação de risco Foto: Reprodução
O veterinário Thiago Luczinski (à dir.) e a equipe do NEX: equipe voltada para proteção de onças em situação de risco Foto: Reprodução

Várias foram apreeendidas pela fiscalização em operações contra o tráfico de animais, como no caso de filhotes cujas mães são mortas por caçadores. E, recentemente, duas onças-pintadas, batizadas de Amanaci e Ousado, passaram a fazer parte do grupo. Elas foram resgatadas com ferimentos graves em áreas tomadas por queimadas na área do Pantanal.

A presidente da ONG, Cristina Giani, disse que jamais havia abrigado felídeos em estágio tão intenso de sofrimento como no caso das duas onças recém-chegadas.

“Me emociono a falar delas. Elas pisaram em brasas, sentiram muitas dores. É a prova da força das onças para suportar e sobreviver”, conta Cristina.

Ousado foi resgatado no Parque Estadual Encontro das Águas, lugar conhecido por ter a maior concentração de onças-pintadas do mundo, em 11 de setembro. Foi encontrado amuado, com as patas feridas, deitado em uma área já devastada pelo fogo – sendo socorrido por uma equipe da Marinha do Brasil que sobrevoava a área.

Amanaci foi localizada  dentro de um galinheiro em Poconé (MT), fugindo do fogo, em 21 de agosto. Em um primeiro momento, acabou atendida na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e, posteriormente, seguiu para o Nex. Estava com queimaduras superficiais na barriga e virilha, e um ferimento mais grave nas patas. Ousado estava com ferimentos nas patas apenas.

“Eles estavam em um estado horrível, não se alimentavam e sentiam muita dor. A onça é um bicho bravo e arredio, e não aceita ser subjugado. É como deve ser. No resgate da Amanaci ela estava deitada com as patas para cima, não reagia, não andava, não levantava para beber água, tremia muito e defendia as patas o tempo todo”, diz o  veterinário Thiago Luczinski, que trabalha no instituto há 10 anos.

Tanto a fêmea quanto o macho precisaram tomar por dias medicações potentes com base em opioide e morfina, tamanha a dor. “Agora eles não estão mais precisando de analgésicos tão fortes”, comemora o veterinário.

As patinhas queimadas do Ousado quando o animal chegou ao Instituto Nex Foto: Divulgação
As patinhas queimadas do Ousado quando o animal chegou ao Instituto Nex Foto: Divulgação

A situação da Amanaci é a mais crítica – ela está recebendo aplicações a cada 10 dias com células-tronco para recuperar o tecido das patas. De acordo com Luczinski, as queimaduras de terceiro grau afetaram os tendões e ocasionaram uma lesão grave.

Logo, o objetivo do procedimento é acelerar a cicatrização e regenerar o tecido das patas, evitando que o animal perca os movimentos. A previsão é de que o tratamento da fêmea leve pelo menos 60 dias, e ainda não há previsão de quando ela poderá retornar à natureza.

Ousado teve mais sorte: as queimaduras foram menos severas do que as de Amanaci, e ele não necessita das aplicações de células-tronco; um tratamento de ozonioterapia será iniciado para auxiliar na cicatrização.

“Os ferimentos são bem extensos, mas ele está se alimentando muito bem, voltou a caminhar, nos primeiros dias ele não ficava nem em pé e já ganhou peso” diz o veterinário.

O trabalho com as duas onças intensificou a rotina no Nex: dia sim dia não, a equipe precisa fazer curativos com bandagem nos animais e há uma profissional de prontidão para observar os animais pela maior parte do tempo. “A gente enfaixa e faz uma espécie de botinha. Nesse momento, quando estão anestesiados, também aproveitamos para medicá-los” explica Luczinski.

A onça depois de resgatada, no Instituto Nex, na cidade de Corumbá de Goiás Foto: Divulgação
A onça depois de resgatada, no Instituto Nex, na cidade de Corumbá de Goiás Foto: Divulgação

Por mês, o tratamento de cada um, sem contar a aplicação de células-tronco (conseguidas por uma parceria) e os honorários dos veterinários, custa R$ 10,5 mil.

RETORNO AO PANTANAL

A previsão do veterinário é que Ousado esteja com o tratamento finalizado em 30 dias; sua chance de retorno ao habitat natural é maior do que a de Amanaci.

Thiago Luczinski, porém, questiona: para onde esses animais vão voltar em segurança?

“Onde ele estava não tem mais como voltar. Como soltar o animal em um lugar onde já não há mato, comida. Será muito mais complicado do que imaginamos”.

No momento, as duas onças-pintadas estão confinadas em um espaço reduzido até que os ferimentos sejam curados. Num segundo momento, elas serão levadas para uma área aberta dentro da fazenda, com cerca de 150 metros quadrados, incluindo tocas e um lago.

“Ter lago é essencial porque onça-pintada gosta de tomar banho e tomar água em lago” explica o veterinário.

Fonte: Época