RIO — Ao longo de uma década de ocupação pelas forças de segurança, o tráfico voltou a dominar os complexos do Alemão e da Penha, conforme mostrou, ontem, reportagem do GLOBO. Sob a condição de anonimato, policiais militares das UPPs das favelas descrevem que a atuação deles ficou limitada. A orientação é evitar os confrontos. A maioria dos militares fica baseada, sem patrulhar.
— É como se houvesse um acordo: a gente não mexe com eles e eles não mexem com a gente. Mas, às vezes, os confrontos acontecem — diz um PM, sem se identificar.
Outro PMs relata que é comum que o comando da UPP solicite “uma ocorrência”, ou seja, que policiais façam ações pontuais, com o objetivo de apreender armas ou drogas para contribuir com a pontuação almejada por oficiais.
Policiais relatam ainda que, mesmo existindo o acordo velado, é comum que haja tiroteio no momento de troca de turno nas bases. Na Nova Brasília, no Alemão, os ataques a tiros acontecem principalmente na base Alvorada. Em 20 de outubro, o tiroteio teve início às 8h e durou mais de uma hora.
A queda na produtividade policial espelha a falta de patrulhamento. No Alemão, nos últimos quatro anos, as apreensões de drogas caíram 95%, segundo números do Instituto de Segurança Pública (ISP). Já as prisões despencaram 86% no mesmo período. Na Penha, a queda de apreensões de drogas no mesmo período foi de 76%, e de prisões, 82%.
O temor de ataques do tráfico às bases das UPPs obrigou os policiais militares a colocarem a mão na massa. Fotos divulgadas para a reportagem mostram reforços construídos pelos próprios PMs na base do Alemão. Numa sala cujas janelas são de vidro, foi colocada uma chapa de aço. Já na entrada da base, do lado de fora da unidade, levantaram um muro de proteção.
O coronel Frederico Caldas chefiava o Comando de Polícia Pacificadora em 2014, quando foram mortos o subcomandante da UPP Vila Cruzeiro e o comandante da UPP Nova Brasília em seis meses:
— Naquele momento, vi o projeto se desintegrar. Eu já tinha um ano de comando na CPP e estava muito insatisfeito com a canibalização que estava ocorrendo para inaugurar novas UPPs.
Fonte: Jornal Extra