RIO – Cinquenta e sete cidades com 26% do eleitorado brasileiro (38,2 milhões de pessoas) vão novamente às urnas neste domingo para escolher o prefeito dos próximos quatro anos. Nas duas principais capitais, os dois candidatos à reeleição chegam ao dia da votação em situações distintas. Enquanto Bruno Covas (PSDB) lidera a apertada disputa em São Paulo contra Guilherme Boulos (PSOL), no Rio Marcelo Crivella (Republicanos) está bem atrás do ex-prefeito Eduardo Paes (DEM).
Na eleição em meio ao recrudescimento da pandemia no Brasil, um fator uniu candidatos de diversos partidos preocupados com a própria popularidade: da situação à oposição nos municípios, ninguém quis se comprometer com medidas de restrição da economia ou da circulação de pessoas que pudessem acarretar prejuízos nas urnas.
O vírus, porém, ignorou o calendário eleitoral. Na disputa de Goiânia, Maguito Vilela (MDB), o favorito a vencer segundo as pesquisas, está internado numa UTI em São Paulo. Justamente na capital paulista, Boulos, a surpresa do primeiro turno nas grandes cidades, não poderá votar porque está em isolamento após o diagnóstico de Covid.
Além da urgência de gestão pública em meio ao aumento de casos e mortes, a eleição será determinante também para o futuro dos políticos submetidos ao voto.
A disputa no Rio recoloca Paes e Crivella em momentos bem diferentes das carreiras. Depois de deixar a prefeitura com boa popularidade, o agora candidato do DEM sofreu reveses consecutivos no Rio e se viu obrigado a recomeçar. Deve derrotar um político que também reescreveu sua trajetória. Crivella acumulou insucessos eleitorais, e elegeu-se prefeito há quatro anos quando procurou afastar-se do estigma de líder religioso e enfrentou adversários que sofriam com alto índice de rejeição.
Mal avaliado ele próprio na sua gestão, deu um cavalo de pau no discurso político: mais além do conservadorismo, abraçou-se ao radicalismo bolsonarista no segundo turno, o que pode limitar suas possibilidades em eleições futuras se confirmada a previsão de que deixa a prefeitura no fim deste ano. O segundo turno no Rio transcorreu sem variação na projeção apontada pelas pesquisas de vitória de Paes, mas com crescente virulência e baixo nível na troca de ataques entre os dois.
Esquerda e bolsonaro
Bruno Covas e Boulos foram elogiados em São Paulo pela disputa mais respeitosa no confronto pessoal — o acirramento se deu pelo crescimento do psolista nas intenções de voto que deixam a disputa em aberto. Se confirmar a reeleição, o tucano se consolida como um novo protagonista em seu partido — de quebra, a vitória favorecerá seu padrinho político, o governador se São Paulo, João Doria.
Boulos já não depende mais do resultado das urnas para sair maior da eleição. Após fraco desempenho na corrida presidencial em 2018, aumentou seu capital político com a campanha de São Paulo, e mesmo se perder, será uma voz nacional no campo da esquerda nos próximos anos.
Bem menos cordata foi a eleição no Recife, onde o enfrentamento entre os primos João Campos (PSB) e Marília Arraes (PT) despertou atenção pela temperatura elevada. Tanto pela rispidez das agressões, com pitadas de crise familiar, quanto pela impossibilidade de se prognosticar quem vencerá (ontem, o Datafolha apontou que ambos chegam empatados com 50% das intenções de votos). A única certeza em Pernambuco é que ocorrerá uma vitória de uma sigla do campo da esquerda. Isso pode acontecer ainda em Belém, com Edmilson Rodrigues (PSOL) liderando as pesquisas, e em Porto Alegre e Vitória, onde Manuela D’Ávila (PCdoB) e João Coser (PT) estão em situação de empate técnico.
O presidente Jair Bolsonaro não deve se recuperar do mau desempenho de aliados há 15 dias. Além de Crivella, o bolsonarista Capitão Wagner (PROS) deverá ser derrotado em Fortaleza. Bolsonaro, aliás, encerra sua participação na disputa vendo a sua popularidade cair em 23 das 26 capitais.
Além de ter sido uma eleição na qual refluiu a onda antipolítica e bolsonarista, o pleito de 2020 ficou marcado por mais limites aos discursos de ódio nas redes. Seja pelo menor engajamento do eleitor na disputa deste ano, com o debate concentrado na pandemia; ou por uma melhora na eficácia das ações de controle de disseminação de desinformação, buscada pelas plataformas de redes sociais e pelas autoridades.
Fonte: O Globo