BRASÍLIA — A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou neste sábado que o pedido entregue pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) para autorização emergencial da vacina de Oxford traz os “documentos preliminares e essenciais para a avaliação detalhada da Agência”. A Anvisa, no entanto, pediu mais informações ao Instituto Butantan, que desenvolve o imunizante em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac.
“Após a triagem de todos os documentos fornecidos, os técnicos da Anvisa verificaram que ainda faltam dados necessários à avaliação da autorização de uso emergencial”, afirmou a agência, em nota, sobre a vacina do Butantan.
Essa análise preliminar é feita nas primeiras 24 horas após a entrega do pedido de uso emergencial para verificar se as informações essenciais sobre eficácia e resultados clínicos estão no processo para análise pela equipe técnica da Anvisa.
Com isso, a agência segue com a análise das informações enviadas pela Fiocruz e dos documentos já protocolados pelo Butantan, enquanto espera os dados que estão faltando relativos à CoronaVac.
“O Instituto (Butantan) foi informado sobre a necessidade dos documentos complementares, essenciais à análise e conclusão sobre a eficácia e segurança da vacina. Na oportunidade, foram discutidos prazos e cronogramas para a apresentação dos dados faltantes”, explicou a Anvisa.
De acordo com a agência, equipes da Anvisa e do Butantan participaram de duas reuniões para tratar da questão neste sábado. “O Instituto Butantan informou que apresentará os dados com brevidade, e a Anvisa continuará a avaliar a documentação que já foi enviada, de forma a otimizar esforços para uma decisão célere sobre o pedido”, explicou a agência.
Na sexta-feira, a Fiocruz e o Butantan solicitaram à agência a autorização emergencial de uso das vacinas desenvolvidas contra a Covid-19. O prazo estimado pela agência para avaliação do pedido é de até dez dias.
Um dia antes, na quinta, o Butantan apresentou à Anvisa os dados sobre vacina. Segundo as informações, a CoronaVac tem eficácia de 78% nos estudos no Brasil. O Butantan, no entanto, não apresentou informações sobre a eficácia global do imunizante.
Em nota, o Instituto Butantan afirmou que seguirá fornecendo os documentos necessário à Anvisa para o pedido de uso emergencial da CoronaVac. Informou, ainda, que os dados solicitados “não afetam o prazo para autorização do imunobiológico”. “Os pedidos de novos documentos ou mais informações são absolutamente comuns em processos como esses”, completou.
Vacinação simultânea
Também neste sábado, o Ministério da Saúde informou que a vacinação contra a Covid-19 deve ocorrer simultaneamente em todo o país, com distribuição proporcional de doses entre os entes federativos. Ontem, o estado de São Paulo afirmou que irá manter o início da vacinação no estado, previsto para o próximo dia 25 de janeiro, independentemente do planejamento federal de imunização.
Na nota divulgada pelo ministério, o governo afirma que decidiu ontem, em reunião com o Instituto Butantan, que as 100 milhões de doses produzidas pela instituição serão incorporadas ao Programa Nacional de Vacinação (PNI) contra a Covid-19. O Butantan desenvolve o imunizante CoronaVac em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac.
O anúncio ocorre dois dias depois que o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, informou que o governo assinou um acordo com o Instituto Butantan para comprar 46 milhões de doses da CoronaVac. Na ocasião, Pazuello afirmou que a pasta poderia ampliar a contratação em mais 54 milhões, totalizando 100 milhões de doses.
“Representantes do Ministério da Saúde e do Instituto Butantan acertaram que a totalidade das vacinas produzidas pelo laboratório paulista serão adquiridas pelo Governo Federal e incorporadas ao Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19”, escreveu a pasta, acrescentando:
“Assim, brasileiros de todo o país receberão a vacina simultaneamente, dentro da logística integrada e tripartite, feita pelo Ministério da Saúde e as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde.”
Apesar do acordo, o secretário da Saúde de São Paulo, Jean Gorinchteyn, destacou na sexta-feira que o estado não irá adiar o início da vacinação caso o PNI não comece antes do dia 25. Uma das possibilidades para o início da vacinação nacional é o dia 20 de janeiro, mas o Ministério da Saúde não confirmou nenhuma data.
Na nota enviada hoje pelo ministério, a pasta ressalta que a campanha de vacinação deve começar “tão logo os imunizantes recebam autorização da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) – para uso emergencial ou o registro definitivo”.
Uso emergencial
Caso a autorização emergencial de uso seja concedida pela Anvisa, a CoronaVac e a vacina de Oxford poderão ser aplicadas em grupos específicos previamente definidos pelos desenvolvedores no pedido apresentado. A autorização emergencial é diferente do registro definitivo pois não permite a aplicação em toda a população e tampouco a comercialização do imunizante.
O mecanismo não era previsto pela Anvisa até dezembro, quando a agência decidiu adotar o procedimento para agilizar a aprovação de vacinas no país.
Já o registro definitivo do imunizante deverá ser solicitado pela própria Sinovac, segundo informou Dimas Covas, presidente do Instituto Butantan, na última quinta-feira. Anteriormente, o governo paulista havia anunciado que seria solicitado junto ao pedido de uso emergencial. No entanto, Dimas explicou que o laboratório chinês deve compilar todos os estudos clínicos em andamento ao redor do planeta para realizar o pedido de registro final do imunizante.
Isso se mostrou necessário porque os ensaios na Turquia encontraram uma taxa de eficácia diferente da identificada pelos pesquisadores do Butantan.
A Fiocruz também deverá fazer o pedido de registro final da vacina até o dia 15 de janeiro.
A exigência da Anvisa
De acordo com a Anvisa, são seis dados que estão em falta nos documentos entregues pelo Butantan. São eles: características demográficas e basais críticas da população do estudo; resultado do estudo por população de “intenção-de-tratamento”; dados sobre a disposição dos participantes; descrição dos desvios de protocolo: listagem de participantes com desvio de protocolo: e dados de imunogenicicidade do estudo da fase 3.
Confira abaixo o que quer dizer cada um:
1. Características demográficas e basais críticas da população do estudo. São os dados básicos com as características de todos os voluntários testados como idade, sexo, raça, peso e índice de massa corporal dos participantes. Também são necessários dados de outras características importantes, por exemplo, função renal ou hepática e comorbidades como hipertensão, diabetes, obesidade.
Tais dados devem ser apresentados de forma completa tanto para quem tomou vacina, como para quem tomou placebo.
Os dados são fundamentais para permitir a comparação entre grupos tratados.
2. Resultados do estudo por população de “intenção-de-tratamento” (ITT). Envolve um recorte mais complexo e detalhado da população que seria alvo da vacinação.
Para a análise dos resultados dos estudos clínicos são definidas duas populações básicas: a primeira é definida pela “intenção-de-tratamento” (ITT) que inclui todos os participantes independentemente de violações de protocolo e perdas de seguimento; a segunda, chamada de “por-protocolo” (PP), é um subconjunto da primeira, e inclui somente os participantes que completaram o estudo de acordo com os critérios do protocolo, excluindo todos os que tiveram algum desvio.
3. Dados sobre a disposição dos participantes, com uma contabilidade clara de todos os participantes.
Significa ter os números exatos sobre voluntários, doses recebidas e número de voluntários que completaram estudo em cada grupo, ou seja, no grupo que tomou vacina e no grupo que tomou placebo. É o dado sobre quantos voluntários receberam a vacina, quantos tomaram placebo, quanto concluíram as duas doses da vacinação.
Esse dado também inclui informação sobre quantos voluntários tiveram acompanhamento pelo período planejado no estudo e explicação sobre voluntários que não concluíram o estudo, de forma detalhada.
Inclui ainda explicação para todas as interrupções, agrupados por tratamento e por motivo principal (perda de acompanhamento, evento adverso, pobre conformidade, etc).
4. Descrição dos desvios de protocolo. É o detalhamento sobre qualquer coisa feita de forma diferente do que estava no protocolo de pesquisa ou que não estava programada. Inclui, por exemplo informações sobre o intervalo entre a primeira e a segunda dose da vacina (ou do placebo).
Estes desvios devem ter uma classificação de impactos para o estudo, ou seja, o quanto eles podem impactar o resultado final.
5. Listagem de participantes com desvios de protocolo. É a lista detalhada de pacientes que tiveram algum tipo de desvio de protocolo (por exemplo, quantos participantes tomaram somente uma dose, quantos tiveram um intervalo maior ou menor entre doses, etc), para cada centro de pesquisa que participou do estudo.
6. Dados de imunogenicidade do estudo fase 3.
É a avaliação que verifica os anticorpos gerados pela vacina e por quanto tempo estes anticorpos permanecem nos participantes da pesquisa.
Fonte: O Globo