No início da semana, milicianos de Jacarepaguá tentaram invadir uma das últimas regiões ainda dominadas pelo tráfico na Zona Oeste. Traficantes falam em ‘resistência até o último homem’
Rio – Reunidos em uma região de mata, traficantes da comunidade Jardim Novo, em Realengo, passaram horas trocando tiros entre a última segunda e terça-feira (8). A guerra que tirou a paz e o sono dos moradores é o estopim de uma tensão alimentada há meses: milicianos de Jacarepaguá se reuniram para tentar tomar a região e, assim, expandir seu território para uma das poucas favelas ainda dominadas pelo tráfico da Zona Oeste. Do lado dos traficantes, a ordem é montar acampamento e não deixar vingar qualquer investida. A comunidade de Realengo é um dos últimos territórios da facção de Celso Luís Rodrigues, o Celsinho da Vila Vintém, preso desde 2002, mas ainda considerado como o ‘pai’ do grupo.Moradores contam que, enquanto trocavam tiros e evitavam a invasão, traficantes do Jardim Novo gritavam ‘Mais Treva’ e ‘Rei’, referência indireta ao líder preso – um dos apelidos de Celso é Trevão. Em troca de mensagens nas redes sociais, criminosos locais falam em ‘resistência até o último homem’. Não é exatamente um exagero: desde a prisão de Antônio Francisco Bonfim Lopes, o Nem, em 2011, e a morte de Celso Pinheiro Pimenta, o Playboy, em 2015, a facção criada na década de 1990 sofreu debandadas e enfraquecimentos, até se tornar praticamente uma ilha na Zona Oeste – da Vila Vintém a Realengo -, cercada de áreas de milícia por todos os lados. A Estrada dos Teixeiras liga as duas partes.
Os milicianos querem a região para expandir o território até o outro lado do Maciço da Pedra Branca. A região mais populosa de Jacarepaguá – bairros como Taquara, Tanque, Gardênia Azul e Curicica – já está sob o controle da milícia, segundo a Polícia Civil. Ali, paramilitares exploram a venda de gás, televisão a cabo e extorquem moradores, comerciantes e motoristas. Na última quarta-feira (9), uma operação da força-tarefa da Polícia Civil prendeu 19 suspeitos de trabalharem para as milícias que comandam a região.
O tiroteio no Jardim Novo começou por volta do meio-dia de segunda-feira, dia 7. Segundo moradores, um grupo armado de fuzil invadiu a comunidade através da região de mata, que liga Realengo a Jacarepaguá. O tiroteio atravessou a tarde e invadiu a noite. Policiais do 14º BPM (Bangu) do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) estiveram na região.
Um carro roubado, com roupas camufladas dentro, foi apreendido pela polícia. Agentes também recolheram 2.210 pedras de crack e 1.560 trouxinhas de maconha. As ocorrências foram encaminhadas para a 33º DP (Realengo). Policiais do 14º BPM (Bangu) seguem com o policiamento ostensivo na região nesta quinta-feira.A tensão diminuiu ao longo da semana, mas moradores seguem com medo do que pode acontecer nos próximos dias. “Fui criado na região, saí na adolescência e resolvi voltar durante a pandemia. Foi um erro que cometi. Esses criminosos não têm ética, noção, podemos receber um tiro a qualquer momento na rua. Somos reféns do medo”, afirma um morador. “Penso seriamente em mandar meu filho para a casa da tia, em outro bairro. É impossível criar uma criança assim”.
Fonte: O Dia Online.