Jornal Povo

A saga do trabalhador: usuários dos trens da SuperVia se queixam do serviço prestado

RIO — Ainda é madrugada quando a vendedora Kátia da Silva, de 36 anos, acorda e se prepara para o trabalho. Moradora de Inhoaíba, na Zona Oeste da cidade, a carioca precisa sair a tempo de embarcar no segundo trem do ramal Santa Cruz, sentido Central do Brasil. Todos os dias, por volta das 4h30, já está na estação. A rotina, no entanto, não é tranquila. Pelo caminho, Kátia e outros milhares de passageiros precisam enfrentar atrasos, lotação, alterações na circulação e outros inúmeros imprevistos. Após problemas recorrentes, o governo do estado decidiu intensificar as fiscalizações e ocupar 12 estações consideradas “perdidas”.

A comerciante vende bolo, café, chocolate, pastéis e salgadinhos na plataforma três da estação de Madureira. Para transportar todo o material, precisa carregar bolsas e caixas de isopor. Sem alternativa e com o atraso constante na circulação dos trens do ramal — que há quase dois anos passou por fusão com o ramal Deodoro e, desde então, funciona apenas como parador —, Kátia precisa pegar trens cada vez mais cheios e conta que corre o risco de danificar seus utensílios e produtos.

— É horrível. O trem que deveria ser o primeiro está atrasando tanto que já vem pegando passageiros do primeiro e do segundo. Fica tão cheio que não tem como ficar dentro. Isso é 4 e pouca da manhã, todo mundo indo para o trabalho, e o trem já está lotado, é um inferno. Teve um dia que quase quebraram o meu isopor. Um pânico — relata a vendedora.

No dia-a-dia da estação, Kátia observa os passageiros que embarcam para a Central e desembarcam do ramal Japeri, e acompanha de perto o drama de quem, assim como ela, depende do serviço. Ela conta que as reclamações e a angústia dos trabalhadores já são comuns.

— É muita gente que para aqui e fica reclamando. Já tem patrão que está mandando embora. É muito trabalhador que não consegue chegar no horário, pega celular, tenta explicar e tira até foto para provar que está esperando o trem — conta.

E o drama não é apenas de quem está em um emprego. Quem procura por uma vaga também sente os efeitos do problema:

— Teve um moço que foi fazer uma entrevista de emprego. Quando perguntaram como ele viria, contou que era de trem. O patrão ficou meio assim, falou que ia entrar em contato e nunca mais ligou. É isso, todo mundo que pega trem não está aguentando mais — diz Kátia.

Na estação de Manguinhos, que integra o ramal Saracuruna, a luta é a mesma. A parada é um dos pontos anunciados pela PM como parte da Operação Estação Segura. Era cerca de 9h quando a jovem Cristina Oliveira, de 22 anos, que mora na comunidade do Mandela e trabalha na região da Uruguaiana, aguardava um trem para chegar ao bairro da Penha, onde precisava resolver algumas pendências antes de ir para o trabalho.

— Eu chego aqui às 8h. Geralmente pego o trem em direção à Central, para ir até o Maracanã, mas tem dia que ele passa 8h25. Passou um trem agora indo para Saracuruna, Gramacho, mas foi direto, não abriu as portas — conta Cristina.

Na última segunda-feira, segundo Cristina, os passageiros chegaram à estação e encontraram portões fechados. Um funcionário da SuperVia avisou que a estação não tinha previsão de abertura. A alternativa dela e de outros usuários foi caminhar por 25 minutos até a estação de metrô do bairro Maria da Graça. Ainda assim, a jovem chegou mais um dia atrasada na clínica em que trabalha. Ela diz que já “perdeu as contas” dos atrasos.

No entanto, a moradora de Manguinhos Tayla Cristina, de 22 anos, não pode contar com a mesma opção. Ela e Cristina trabalham na mesma rede de clínicas, mas a unidade de Tayla fica na Penha, e, para ela, o metrô não é uma alternativa viável. Quando não consegue ir de trem, precisa ir até o Jacaré tentar pegar um ônibus. Segundo ela, o transtorno é maior porque as ocorrências nunca são previstas.

— Em vez de avisar um dia antes que o trem vai parar, eles avisam no dia. A gente chega aqui e está tudo fechado, e patrão nem sempre entende, pode até dar uma advertência — diz Tayla.

Há, também, quem tenha se cansado de insistir. É o caso da operadora Janaína Sousa, de 31 anos. Ela mora em Anchieta e desistiu de usar os trens do ramal Japeri para chegar ao trabalho, no Centro do Rio. Apesar de morar mais próximo da estação de trem, ela resolveu apostar no metrô. Mesmo precisando pegar um ônibus para chegar à Pavuna, ela diz que chega mais rápido.

— Eu deixava o trem passar porque vinha lotado demais, aí ficava esperando, às vezes me atrasava um pouco, e o metrô é mais rápido. Agora só pego o metrô. É bem melhor.

Fonte: Extra