Jornal Povo

Golpes:”Bandidos se passam por entregadores de aplicativo para cometer assaltos no Rio”

Rio tem onda de roubo e violência envolvendo falsos entregadores de aplicativos de delivery

Madrugada de sábado, dia 14 de maio, por volta de 1h, na Tijuca, Zona Norte do Rio. Após sair de um bar, uma estudante, de 21 anos, caminha pela Rua General Canabarro ao lado de mais seis jovens. Ela nota a aproximação de três ciclistas usando bags de entrega dos aplicativos iFood, Uber Eats e Rappi, mas julga que a situação não representa perigo. Estava enganada. Armado com facas, o trio de ladrões cercou o grupo, anunciando o assalto. A jovem teve a mochila, com celular, documentos e carteira, levada por um dos bandidos. Uma amiga, ameaçada, também perdeu a mochila, onde estavam um telefone e uma bolsa.

Aumento de denúncias

Não se trata de um caso isolado. Em São Paulo, no início de maio, o governo estadual anunciou uma série de medidas para coibir a ação de criminosos que se passam por entregadores de aplicativo e praticam roubos e furtos na cidade. A “Operação Sufoco” ganhou as ruas dias depois que um jovem de 20 anos foi assassinado por um homem que fingia trabalhar com delivery. Ainda misturados, nas estatísticas, a outros tipos de roubo, crimes cometidos por falsos entregadores, em geral contra pedestres, chamam atenção no Rio desde o ano passado.

No dia 29 de abril de 2021, câmeras de segurança flagraram um assaltante que, no Grajaú, na Zona Norte, tentou roubar o celular de uma mulher. Ela reagiu e o bandido fugiu de mãos abanando. Aparelhos telefônicos são os alvos principais dos ataques, que têm como vítimas preferenciais mulheres, casais ou pessoas desacompanhadas.

Do final de 2021 a maio deste ano, entre registros em delegacias e casos publicados pela mídia, pelo menos 28 episódios desse tipo no Rio. O número real, no entanto, pode ser bem maior. Baseado em relatos recebidos pelas redes sociais, o Sindicato dos Prestadores de Serviços por Meio de Aplicativos e Software do Rio de Janeiro (Sindmobi) estima que, neste começo de 2022, houve um aumento de 10% das denúncias recebidas sobre casos de assalto praticados por falsos entregadores, em relação ao mesmo período do ano passado.

— São relatos vindos da Zona Sul, de bairros como Copacabana e Botafogo, mas também da Zona Norte, de pontos como Vista Alegre, Irajá e Méier — disse Luís Correa, presidente do Sindmobi, esclarecendo que os casos teriam acontecido nas ruas, e não em residências.

A estimativa do Sindmobi está em sintonia com dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), de abril de 2022, que registram um acréscimo de 11,6% dos casos de roubos de celulares no Rio de Janeiro, na comparação com os registros do mesmo mês do ano passado. Não é possível apontar, no entanto, quantos desses assaltos teriam sido cometidos por falsos entregadores.

Entre setembro e dezembro do ano passado, uma investigação da Polícia Civil identificou o falso entregador Lucas Batista do Nascimento, de 22 anos, como autor de 19 assaltos ocorridos no período acima, na Zona Sul. Gordinho, como é conhecido, foi preso no dia 2 de dezembro pela PM, com um carro e um celular roubados. De acordo com o delegado Daniel Rosa, da 10ª DP (Botafogo), que investigou a série de roubos quando esteve à frente da 15ª DP (Gávea), Gordinho alugava bag e motocicleta para executar os assaltos.

— Ele usava sempre motocicleta e bag diferentes nos roubos. Tinha atuação na Zona Sul, em bairros como Leblon, Gávea, Ipanema e Botafogo. Geralmente parava o veículo em uma rua, como se estivesse procurando um endereço. Na verdade, estava procurando uma vítima. Os aparelhos roubados eram vendidos para um receptador por metade do preço de mercado — contou o delegado.

Gordinho foi reconhecido no dia 9 de setembro, no Leblon, quando teria cometido dois assaltos em pouco mais de um minuto. Em imagens de uma câmera de segurança, ele aparece abordando um homem saindo de um prédio com um cachorro. A ação dura 20 segundos. Quarenta e seis segundos depois, ele rouba um casal que entrava em um carro no mesmo bairro. Em outubro, voltou a atacar ao render um homem, na Gávea, que havia acabado de sair de um prédio. No último dia 17 de maio, Lucas do Nascimento foi condenado a sete anos de prisão por um dos crimes cometidos em 2021.

O delegado Antenor Lopes, diretor do Departamento Geral de Policiamento da Capital, aconselha as vítimas a fazerem sempre o registro de ocorrência para que a polícia possa planejar melhor ações que evitem esse tipo de crime:

— O registro é muito importante para termos uma radiografia do problema. Com os dados, a Polícia Civil poderá intensificar as investigações, e a Polícia Militar poderá ordenar melhor o patrulhamento ostensivo.

A PM informa que o combate aos roubos de rua tem sido uma das prioridades da corporação. E que, em maio, equipes em motocicletas e viaturas iniciaram um reforço no policiamento em diversas áreas e vias expressas da Região Metropolitana, numa estratégia que abrange as zonas Sul, Norte e Oeste do Rio.

Respostas das empresas

Procurado, o aplicativo iFood disse repudiar qualquer prática de criminosos que prejudique a imagem e o trabalho dos entregadores. O aplicativo ressaltou que não há exigência de uso da bag com o logo para fazer entregas, e que o fato de uma pessoa estar utilizando uma bag com a marca do iFood não significa que esteja fazendo uma entrega pela empresa. Disse ainda que umas das medidas de segurança adotadas é a ativação periódica de uma ferramenta de reconhecimento facial para coibir o aluguel e empréstimo da conta e, assim, “proteger o entregador honesto em nossa plataforma”.

Já o Rappi informou que “condena a ação de criminosos que se passam por entregadores para cometer delitos, resultando em um grave problema de segurança pública”. O aplicativo alegou que, entre outras medidas de segurança, após o cadastro efetivado dos entregadores, o sistema faz reconhecimento facial em tempo real para confirmar a identidade do entregador. A Uber Eats, por sua vez, afirma que encerrou suas atividades no Brasil em março.