Jornal Povo

Pais de bebê vítima de meningite denunciam negligência: ‘Não é só uma vida’

Rio – Pais de uma bebê de 2 anos denunciam o Hospital Municipal Lourenço Jorge, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio, por negligência médica no atendimento da filha. Allana Cecília Aparecida Muniz Nascimento estava internada na unidade desde o dia 31 de julho e morreu na última terça-feira (9), vítima de uma meningite bacteriana De acordo com o pizzaiolo Vinícius Nascimento, 26, e a assistente Alessandra Muniz, 28, a criança tinha a caderneta de vacinação em dia.

Segundo o pai da menina, na noite do último dia 30 eles a levaram ao hospital depois que ela apresentou febre de 39ºC e convulsões. Na unidade, ela passou por um exame de raio-x que não constatou alteração e foi liberada com a prescrição de medicamentos para tratar uma gripe. Entretanto, na tarde do dia seguinte, a criança permaneceu com os sintomas e voltou ao local, onde foi internada na Emergência.

No hospital, a bebê chegou a receber três medicamentos para interromper as convulsões e precisou ser sedada. Ela sofreu uma parada respiratória e foi intubada. Na noite do mesmo dia, uma tomografia atestou que Allana tinha um inchaço no cérebro, mas não pôde fazer o exame de punção lombar, que extrai o líquido cefalorraqueano (líquor) para o diagnosticar doenças que afetam o sistema nervoso, pelo risco de ficar paraplégica.

Após a realização de mais exames, foi constatado que a menina não apresentava mais atividade cerebral, estava com os pulmões comprometidos por uma pneumonia bilateral e um inchaço no fígado. Com o agravamento no quadro clínico, surgiu a suspeita de meningite.

“A gente achou que foi negligência porque, no sábado (30), quando a gente esteve aqui no Pronto Atendimento, como que a médica receitou um xarope, dipirona e um remédio para o vômito dela, achou que era uma gripezinha e deu alta, e no domingo, quando a gente já veio com o quadro muito gravíssimo? A negligência foi no primeiro atendimento. Se tivessem coletado sangue dela, eles iam conseguir, talvez, salvar a minha filha. Ela não viria a óbito”, lamentou Vinícius.

Vinícius e Alessandra também se queixaram de que mesmo com a suspeita da doença, a menina não foi colocada em isolamento e ficou junto com pacientes com outras enfermidades. Eles também relataram que viveram uma série de problemas no atendimento, como a dificuldade de enfermeiros e médicos em colocar os acessos nas veias da vítima. Allana chegou a ficar sem receber um medicamento, porque o expediente da profissional que a atendia já havia se encerrado.

A enfermeira também não fechou o coletor de urina da paciente que foi encontrado vazio cerca de quatro horas depois. Uma médica então achou que os rins dela haviam parado e a colocou para receber soro. Segundo Vinícius, a mesma médica não soube fazer a coleta de sangue e verificar a saturação da menina. Além disso, o aparelho que monitorava a criança estava com defeito e foram necessários usar três equipamentos diferentes para pressão, saturação e batimentos cardíacos.

Allana ainda sofreu diversas taquicardias durante a internação. O pizzaiolo e a assistente precisaram fazer a manobra vagal no pescoço da menina para baixar a frequência cardíaca, por conta da demora da chegada dos médicos para o socorro. No dia 2, os pais da menina foram informados de que ela teve morte encefálica. Entretanto, ela permaneceu internada, porque para atestar esse tipo de morte é necessário realizar um protocolo de três etapas, que só foi aberto no dia 4.

O pizzaiolo também lamentou a insensibilidade da médica, que enquanto abria o protocolo, comentava em tom de brincadeira com as estagiárias quanto recebia pelos plantões que faz na rede privada. “Eles estão lidando com o amor de alguém. Não é só uma vida, é o amor de alguém. Não teve a mínima empatia”, disse ele. Os pais da bebê foram orientados a procurar a ouvidoria do hospital para relatar o mau atendimento. Eles também pretendem processar a unidade de saúde por negligência médica.

Antes do enterro, Alessandra e Vinícius doaram os rins da filha. O corpo da menina foi sepultado na tarde desta quinta-feira (11), no Cemitério Jardim da Saudade, em Sulacap, na Zona Oeste. Toda a família se emocionou na despedida, que contou com fotos da menina na capela. A mãe chegou a passar mal. Os pais descreveram Allana como uma criança sorridente, carinhosa e inteligente. Eles também disseram que só vão guardar boas lembranças da bebê. 

“Até o enterro foi muito dolorido. Ainda está sendo. O que não vai faltar são fotos e lembranças. A gente acaba olhando e chorando, ainda fica muito comovido. Não é o natural do ciclo da vida. O natural é a gente enterrar nossos avós, nossos pais, não enterrar nossa filha de 2 anos. O que faz a gente ser forte é que a nossa pequena conseguiu salvar duas vidas, dois amores de alguém. É gratificante, mas não tira o vazio. É como se fosse um abismo que não vai fechar. Um vazio no peito”, desabafou o pai.