Jornal Povo

Milicianos e traficantes praticam extorsão via Pix

Milicianos que fazem cobranças de comerciantes são presos. Foto: Reprodução

O Pix também vem sendo utilizado por criminosos no Rio em extorsões. Investigações apontam que a milícia e o tráfico utilizam a prática para receber, por exemplo, valores referentes a cobrança de taxas ilegais, impostas a moradores e comerciantes. A indicação do uso da transferência eletrônica para engordar o lucro dos milicianos e traficantes com a exploração de atividades irregulares consta em uma contabilidade apreendida pela Polícia Civil em poder de um paramilitar, preso no último dia 29 de março, em Itaguaí.

Em um dos trechos do documento, que ainda está sendo analisado por investigadores da Delegacia De Repressão às Ações Criminosas Organizados e Inquéritos Especiais (Draco-IE), constam dois valores (R$ 400 e R$ 500) ao lado da palavra Pix e dos nomes dos supostos pagadores, que seriam comerciantes da cidade. O bandido seria ligado a Wellington da Silva Braga, o Zinho, acusado de chefiar uma milícia na Zona Oeste e em parte da Baixada Fluminense. A polícia vai tentar confirmar se a transferência ocorreu e para que conta. Um dos agentes fala do modus operandi:

— O Pix já é uma forma utilizada pelos cobradores da milícia para receberem o pagamento de taxas impostas pelos grupos paramilitares.

Para receber qualquer valor por transferência eletrônica há necessidade de uma conta bancária e um número de CPF. Segundo a polícia, bandidos têm usados “laranjas” (pessoas que às vezes, sem saber, emprestam seus nomes a uma organização criminosa ao ter um documento clonado) para conseguir obter o Pix. A partir daí, uma conta é aberta e passa a ser utilizada para este fim. A delegada Ana Paula Faria, diretora do Departamento Geral de Combate à Corrupção, ao Crime Organizado e à Lavagem de Dinheiro ( DGCOR-LD), que trabalha com os delegados Thaianne Moraes, do Laboratório de Tecnologia Contra lavagem de Dinheiro, e com o delegado Ricardo Carrareto, da Delegacia de Combate às Organizações Criminosas e à lavagem de Dinheiro, confirma que o pagamento eletrônico vem sedo utilizado por grupos criminosos.

— É uma situação recorrente na tática das organizações criminosas para tentar criar subterfúgios e dificultar o trabalho da polícia. Existem investigações em andamento e análises sendo feitas.

Lista detalhada do que é extorquido

Em março, pelo menos três pessoas foram presas em flagrante fazendo cobranças para milícia no Rio. Uma das operações aconteceu no dia 16, quando agentes da Draco prenderam em Campo Grande Paulo Roberto Vasconcellos Gayo e Rodrigo Luiz Torres Pacheco. Eles foram apontados numa investigação com suspeitos de integrar o bando de Luís Antônio da Silva Braga, o Zinho, e de serem os responsáveis pela extorsão contra motoristas de vans. Com eles, foram apreendidos um caderno com a anotação de veículos, placas, nomes de motoristas, confirmações de pagamento e uma quantidade em dinheiro.

Entre o início de março e o último dia 2 de maio, ao menos dez pessoas morreram, entre os Bairros do Anil, Gardênia Azul, e Recreio dos Bandeirantes, na Zona Oeste, em meio a disputas de grupos de milicianos. As áreas têm o controle de territórios disputados por traficante, milicianos e paramilitares rivais. Em um dos casos, ocorrido no dia 4 de mar, na Estrada Tenente Coronel Muniz de Andrade, na Gardênia, a polícia investiga a informação de que pessoa assassinada seria cobrador de uma milícia chefiada pelo paramilitar Leandro Xavier da Silva, o Playboy. A vítima foi morta num carro. Uma postagem em uma rede social, feita por um homem supostamente ligado a Philip Motta Pereira, o Lesk, que disputa com o bando do miliciano Playboy o domínio da Gardênia Azul, e ainda conta com o apoio de traficantes.

‘Salário’ dos cobradores tem variação

“É promoção que tá rolando. Presta atenção milícia. Vem cobrar taxa aqui que ganha 30 ( tiros) na cara”, disse o homem mostrando um fuzil e vários carregadores, ao comentar o homicídio. O segundo caso ocorreu no dia 2 de maio, quando dois homens foram mortos a tiros no Terreirão, no Recreio. Informações preliminares recebidas pela Delegacia de Homicídios da Capital dão conta que a dupla fazia cobrança quando foi atacada a tiros por homens que estavam em um carro não identificado.

Investigações mostram que o salário dos cobradores de grupos paramilitares, que ganham uma porcentagem do que é recolhido por eles, varia conforme os valores arrecadados por cada um. Os mais antigos em cada grupo, por exemplo, são os encarregados de recolher quantias maiores, geralmente em comércios de grande porte.