Jornal Povo

61 Candidatos nas Eleições 2024 Têm Mandados de Prisão em Aberto; Maioria por Dívidas de Pensão Alimentícia

Um levantamento exclusivo do g1 revelou que 61 candidatos concorrendo nas eleições de 2024 possuem mandados de prisão em aberto. A maioria dos casos (47) está relacionada a dívidas de pensão alimentícia, enquanto 14 envolvem crimes graves, como homicídio e estupro de vulnerável. No último sábado (14), o portal também trouxe à tona que três candidatos eram procurados pelos ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023. Desde então, dois foram presos e um segue foragido.

Crimes Envolvidos

Entre os 14 casos criminais estão três mandados de prisão por homicídio, dois por estupro de vulnerável, quatro por furto ou roubo, dois por estelionato, um por lesão corporal e um por associação criminosa. Em um dos casos, o crime não pôde ser identificado. Além disso, 13 dessas investigações envolvem prisão provisória, geralmente aplicada antes de o investigado ser condenado ou absolvido pela Justiça. Apenas um dos mandados refere-se a uma condenação definitiva.

Casos de Pensão Alimentícia

A grande maioria dos mandados (46) diz respeito a dívidas de pensão alimentícia. Este tipo de prisão pode ser revogada imediatamente após o pagamento do valor devido, o que permite que os candidatos sigam participando do pleito mesmo com o mandado em aberto. Para Alberto Rollo, especialista em direito eleitoral, “a condenação por não pagamento de pensão não entra no rol de restrições da Ficha Limpa, por isso eles não são impedidos de concorrer”.

Legalidade das Candidaturas

Segundo a legislação brasileira, possuir um mandado de prisão em aberto não impede a candidatura, a menos que o indivíduo tenha sido condenado de forma definitiva ou por um colegiado de juízes. No entanto, candidatos com mandados de prisão ativos podem ser detidos a qualquer momento, caso sejam localizados. Durante a apuração desta reportagem, um dos candidatos foi preso após a polícia ser informada sobre a situação.

Debate Jurídico

O professor de direito eleitoral da FGV, Fernando Neisser, destaca que não se deve impedir a candidatura de pessoas que ainda não foram consideradas culpadas. “Pode causar estranheza termos alguém se candidatando quando poderia estar preso. Mas é justo, sob pena de afastarmos das urnas pessoas que nem mesmo foram consideradas culpadas em primeira instância”, afirma Neisser. Para ele, impedir a candidatura antes de uma condenação definitiva seria uma medida desproporcional.

Repercussão dos Casos de 8 de Janeiro

No sábado (14), o g1 revelou que três candidatos das eleições 2024 eram procurados pelos atos golpistas no Congresso Nacional, no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Palácio do Planalto, ocorridos em 8 de janeiro de 2023. Desde a publicação, dois foram presos, enquanto o terceiro é considerado foragido pela polícia.

Mudanças a Qualquer Momento

O número de candidatos com mandados de prisão em aberto pode mudar rapidamente. Eles podem ser declarados inaptos pela Justiça Eleitoral, ou os mandados podem ser excluídos do Banco Nacional de Mandados de Prisão (BNMP) pelos tribunais, caso sejam cumpridos ou revogados. Na manhã desta quarta-feira (18), todos os 61 candidatos ainda constavam como aptos a disputar as eleições e estavam listados no BNMP como alvos de ordens de detenção pendentes de cumprimento.

Posicionamento dos Candidatos e Partidos

O g1 entrou em contato com todos os candidatos e seus respectivos partidos para obter um posicionamento oficial. Até o momento, apenas alguns responderam. Muitos afirmaram desconhecer a existência de mandados de prisão ou justificaram a situação como um problema a ser resolvido judicialmente.

Desdobramentos Futuros

A expectativa é que, nos próximos dias, mais candidatos possam ser presos ou resolverem suas pendências jurídicas. A situação chama atenção para a necessidade de transparência e rigor na fiscalização das candidaturas, principalmente em um ano eleitoral tão importante para o país.

Conclusão

A presença de candidatos com mandados de prisão em aberto no pleito de 2024 levanta questões sobre a transparência e a ética no processo eleitoral. Embora a legislação permita que esses indivíduos concorram, a situação pode gerar desconforto e questionamentos sobre a idoneidade dos candidatos e a confiança dos eleitores nas instituições democráticas.

Os 3 candidatos alvos de mandados por homicídio

▶️ Candidato diz que desconhecia investigação:

Djalma de Laranjeira (Avante), nome de urna de Djalma Juriti da Silva, tenta se eleger vereador em Lamarão (BA). 

Ele é alvo de um mandado de prisão preventiva expedido em 2018 por conta de um homicídio ocorrido em São Paulo (SP) em fevereiro de 2016. O julgamento ainda não foi concluído. 

O advogado de Silva, Weliton Mota, afirma que seu cliente não tinha conhecimento do processo e que buscaria os meios legais para “apresentar sua defesa e provar sua inocência”. 

▶️ Candidato diz que foi legítima defesa:

Jobson Francisco de Melo concorre como Jobson para vereador de Paudalho (PE) pelo PL. Segundo o BNMP, ele é alvo de um mandado de prisão preventiva emitido em 3 de setembro numa investigação sobre homicídio. 

Ao g1, Melo afirmou que o mandado de prisão é um equívoco e que a defesa pediria a revogação. O candidato diz que “foi vítima de uma agressão injusta, o que acabou por revidar, agindo em legítima defesa, e que tudo será esclarecido no momento oportuno”. 

O PL não havia se manifestado até a última atualização desta reportagem. 

▶️ Candidato é alvo de mandado expedido em 1997:

Nelson de Jesus Pereira, candidato com nome de urna Nelson Guará (Cidadania) de Varzelândia (MG), é alvo de mandado de prisão preventiva emitido em 1997 (e renovado em junho de 2024) por um homicídio de 1996 após uma discussão em um bar. O julgamento ainda não foi concluído. 

Pereira, que foi candidato em 2016 e 2020, não respondeu aos contatos feitos pelo g1. A coligação do candidato disse que foi surpreendida pela existência da ordem e que foram cumpridas “todas as exigências legais no que se refere à gestão eleitoral”.

Alvos de mandados podem ser presos

Se forem encontrados, candidatos com mandado de prisão em aberto podem ser presos. 

Foi o que aconteceu com Marcos Geleia Patriota (Novo) e Pastor Dirlei Paiz (PL), que disputam vagas de vereador em Céu Azul (PR) e Blumenau (SC), respectivamente. Ambos eram procurados por envolvimento nos atos golpistas em Brasília e foram detidos após o g1revelar que havia mandados contra eles no BNMP. Um terceiro é considerado foragido. 

Entre 21 de setembro e 8 de outubro, entretanto, essas prisões não podem ocorrer. Isso porque a legislação eleitoral estabelece que, nesse período, candidatos só podem ser detidos em caso de flagrante.

Entre casos criminais, maioria é de prisão provisória

Entre as investigações criminais, a maioria das ordens de prisão são provisórias (13) – usadas, em geral, antes de o investigado ser condenado ou absolvido pela Justiça. Duas, entretanto, são por conta de condenações definitivas. 

▶️ Candidato foi condenado em um estado e concorre por outro:

Candidato Valbert Furtado Rabelo em reprodução da página de candidatura do TSE feita nesta quarta-feira (18). — Foto: Reprodução/TSE

Valbert Furtado Rabelo, candidato com nome de urna Rabelinho, disputa o cargo de vereador em Baturité (CE) pelo PRD (fusão do Patriota com Partido Trabalhista Brasileiro). 

Segundo o Banco Nacional de Mandados de Prisão, Rabelo foi condenado pela Justiça de Pernambuco em um processo sobre roubo e associação criminosa, e teve mandado de prisão expedido contra ele em maio de 2023.

Ao se candidatar, Rabelo apresentou certidões negativas da Justiça estadual e da Justiça Federal no Ceará, onde concorre — não há obrigatoriedade de envio das certidões de outro estado. 

“A ausência de um banco nacional de processos, que abrangesse todas as justiças estaduais e federais, permite que uma pessoa condenada ou foragida por um crime grave possa disputar uma eleição”, afirma Neisser, da FGV.

g1 procurou Rabelo pelo Instagram, mas não recebeu resposta. O diretório estadual do PRD informou que os diretórios municipais têm autonomia para escolher os candidatos, e que pediu um posicionamento do órgão em Baturité para tomar providências. 

O candidato foi preso na tarde desta quarta, após o g1 entrar em contato com a Polícia Civil do Ceará para perguntar se o considerava foragido. 

“O suspeito foi preso em um imóvel no bairro Mondengo por equipes da Delegacia Regional de Baturité com o apoio do Departamento de Polícia Judiciária do Interior Norte (DPJI-Norte). O homem foi conduzido para a Delegacia Regional de Baturité, onde os mandados foram cumpridos. Agora, o suspeito encontra-se à disposição da Justiça”, informou a polícia, em nota.

▶️ Candidato registrou candidatura 4 dias antes de condenação se tornar definitiva:

Candidato Celmar Mucke em reprodução da página de candidatura do TSE feita nesta quarta-feira (18). — Foto: Reprodução/TSE

Celmar Mucke, que disputa o cargo de vereador em Tupanci do Sul (RS) pelo União Brasil, foi condenado definitivamente a 9 anos de prisão em regime fechado por estupro de vulnerável. Ele registrou a candidatura 4 dias antes de a decisão se tornar definitiva. 

“É uma situação bem curiosa que eu acredito que vá levar, sim, a um debate no judiciário se ele for eleito”, afirma Neisser.

g1 não conseguiu contato com Mucke. O diretório estadual do União Brasil no Rio Grande do Sul informou que os diretórios municipais têm autonomia para registrar candidaturas. O diretório municipal de Tupanci do Sul não se manifestou. 

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) afirmou ao g1 que “foi instaurado processo para tratar da questão” e que Mucke é “considerado foragido”.

Como o g1 fez o levantamento

O BNMP é um banco de dados administrado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e alimentado pelos tribunais de todo o país. Cabe a esses tribunais excluir os mandados caso eles tenham, por exemplo, sido revogado pelos juízes ou cumpridos pela polícia. 

Segundo o CNJ, em geral, os mandados de prisão que constam do BNMP banco estão válidos. “Porém, como acontece com sistemas em geral, ele depende da boa inserção de dados e a correta utilização”. 

g1 comparou o nome, a data de nascimento e o CPF ou RG que constam nas decisões judiciais com os da Justiça Eleitoral para chegar à lista de 61 candidatos.