Jornal Povo

Coronavírus: Isolamento registra queda, e ruas mais cheias podem levar a uma segunda leva de contaminação no Rio

RIO – Moradores do município do Rio estão aderindo menos ao isolamento social recomendado pelas autoridades como medida de prevenção ao novo coronavírus. Números da empresa de inteligência artificial Cyberlabs mostram que a cidade apresentou um isolamento de 74% na última segunda-feira, enquanto há 15 dias essa taxa era de 79%. Da última vez que esse patamar foi registrado, nos dias 11, 13 e 14 de abril, houve um aumento exponencial do número de infectados duas semanas depois, chegando a 763 novos casos em apenas 24 horas. As datas coincidem com o prazo médio de 14 dias indicado por especialistas e pelo Ministério da Saúde como o tempo de incubação do coronavírus após o contato.

O infectologista Edimilson Migowski, diretor de relações externas da UFRJ, aponta que os números podem indicar uma segunda leva de contaminação de Covid-19.

— A doença tem se manifestado na primeira semana após o contato com o vírus. Porém, há sempre uma segunda onda de contaminação, quando os primeiros infectados transmitem o vírus para até duas ou três pessoas. As pessoas burlaram o isolamento, foram contaminadas e depois infectaram mais pessoas, inclusive parentes e amigos.

Banho de sol na Praia da Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio, nesta terça-feira de sol. Movimentação na orla mostra que quarentena não vem sendo cumprida por grande parte da população Foto: FABIO MOTTA / Agência O Globo
Banho de sol na Praia da Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio, nesta terça-feira de sol. Movimentação na orla mostra que quarentena não vem sendo cumprida por grande parte da população Foto: FABIO MOTTA / Agência O Globo

Migoswky ressalta que um novo pico da doença daqui a duas semanas pode ser ainda pior devido à saturação da rede de saúde:

— É um dado preocupante. As pessoas burlaram o isolamento, foram contaminadas e depois infectaram mais pessoas, inclusive parentes e amigos. Hoje, 412 infectados esperam em filas de UTIs. Projeto que o Rio poderá ter até mil pessoas esperando por uma vaga. Uma variável, no entanto, é o uso obrigatório de máscaras, o que ajuda a conter o avanço da doença.

O bairro em que mais pessoas saíram de casa anteontem, entre os monitorados por meio de câmeras pela Cyberlabs, foi Botafogo, na Zona Sul, com 67%. Isso significa que foi registrada uma queda de 67% do número de pessoas nas ruas em relação a uma segunda-feira antes do início da quarentena. Na sequência, com 70% de redução, está Copacabana, segundo bairro em número de mortes pela Covid-19 (37). Ontem, a equipe do GLOBO flagrou filas em mercados e bancos no bairro, principalmente na Rua Barata Ribeiro e na Avenida Nossa Senhora de Copacabana, o que criou aglomerações. Nas últimas semanas, a cidade vinha mantendo o índice de aglomeração em torno de 80%.

Na Zona Oeste, o comércio popular de Campo Grande também tinha muitas pessoas circulando. Ontem, o bairro passou Copacabana no registro de mortes, com 38 óbitos por coronavírus na capital. Nem as lojas fechadas afastaram a população, que seguiu nas ruas do bairro. Já no Centro do Rio, próximo ao Largo da Carioca, muitos comerciantes faziam atendimento na calçada, o que causou aglomerações.

A Cyberlabs vem trabalhando em parceria com o Centro de Operações Rio (COR), da prefeitura. A medição de aglomeração é feita com base nas imagens de 800 câmeras de videomonitoramento de entidades privadas e públicas, incluindo as 400 da governo municipal.

Multa e processo criminal

O governador do Rio, Wilson Witzel, afirmou nesta terça-feira que o estado levará para a delegacia e processará criminalmente pessoas que estiverem em aglomerações, em calçadões e áreas de lazer, e que fechará e multará estabelecimentos comerciais que descumprirem o decreto de quarentena.  O aumento no rigor se dá porque estudo do Gabinete de Segurança Institucional aponta que 60% da população do estado têm ignorado as normas e seguem indo para as ruas. Anteontem, a capital registrou uma das menores taxas de adesão ao isolamento social (74%).

Segundo o boletim divulgado ontem pela Secretaria estadual de Saúde, o Rio já registra 1.123 mortes desde o início da pandemia e 12.391 casos confirmados da Covid-19. Nas últimas 24 horas, foram 670 pessoas infectadas e 58 mortes. A capital continua sendo o epicentro no estado, com 713 mortes pelo coronavírus e 7.832 contaminados. Witzel anunciou o rigor na fiscalização da quarentena após uma reunião com representantes do Ministério Público (MP-RJ) e da Defensoria Pública do Rio.

— Estamos fazendo isso para evitar que tenhamos mais pessoas indo para hospitais públicos e privados, que estão no seu limite de atenção neste momento — disse o governador.

Estudo sobre lockdown

Fontes do Palácio Guanabara contaram que os valores das multas ainda serão definidos e devem ser publicados no Diário Oficial apenas na semana que vem. O Ministério Público, no entanto, acredita que as medidas devem ser mais severas. O órgão pediu ao governo do estado um estudo sobre a possível adoção de lockdown, afirmando haver “a necessidade de recrudescimento e ampliação das medidas de isolamento social”.

Ao GLOBO, Witzel afirmou na semana passada que não cogitava tomar essa decisão, mas admitiu anteontem, em entrevista à TV Cultura, que um fechamento total pode vir a ser estabelecido pelo Poder Judiciário, a exemplo do que aconteceu no Maranhão.A promotoria já enviou ao governador do Rio um documento recomendando que, num prazo de 72 horas, seja feito um estudo sobre a viabilidade de ockdown.

Segundo o texto, antecipado pela coluna de Guilherme Amado, da revista Época, a análise deve ser embasada em “evidências científicas e em análises sobre as informações estratégicas em saúde, vigilância sanitária, mobilidade urbana, segurança pública e assistência social”. Deve ser feita ainda uma estimativa de quantas “vidas serão poupadas” com um eventual lockdown.O MP-RJ alega que “os países que implementaram (o fechamento total) conseguiram sair mais rápido do momento crítico”, mas ressaltou que a medida traz “alto custo econômico”.

Fonte: O Globo